BRASIL

Comando da Câmara acirra tensão entre PT e Eduardo Cunha na busca por apoios

A presidência da Câmara acirrou nos últimos dias a disputa entre o PT e o PMDB do líder Eduardo Cunha (RJ) pelo apoio dos demais partidos da base e entre aquelas legendas que atuam de forma mais independente. Cunha, pré-candidato em plena campanha de bastidor, e mesmo o PT falam em dialogar inclusive com a oposição para tentar levar a melhor. Partidos adversários do governo, entretanto, estudam se Júlio Delgado (PSB-MG) terá viabilidade de derrubar nome governista para embarcar na canoa socialista.

Além da formação de um grupo especificamente para atuar na negociação, anunciado ontem após reunião da bancada, o PT conta com o reforço do governador do Ceará, Cid Gomes, para a construção de uma chapa vencedora. Cid tem atuado em conversas com partidos da base, para prevenir qualquer tipo de dissidência. Assim, esteve com parlamentares do PDT e PCdoB, além de manter encontros com correligionários do PROS. Cid também tem a missão de garantir a fidelidade do PSD, partido recém-incorporado à base, mas que se divide sobre a eleição na Mesa.

Tanto que vem do PSD um dos apoios à candidatura de Delgado. Ricardo Izar (PSD-SP) não descarta fazer dobradinha com o socialista para garantir um lugar na Mesa Diretora depois de um ano a frente do Conselho de Ética da Casa. Izar e Delgado buscam apoios até entre as fileiras do PMDB, em figuras menos entusiasmadas com a liderança de Cunha. O empenho da dupla é para evitar o que aconteceu em 2013, quando Delgado acabou derrotado por Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que então disputou com o apoio do Planalto. “Vamos fazer o que for necessário para não morrer na praia”, resume Delgado.

O PT pretende cobrar a fatura de quem não apoiar seu candidato. Considera inaceitável a eleição de Cunha e sabe o que isso pode significar para o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Mesmo sem um nome definido – Arlindo Chinaglia (SP) e Marco Maia (RS) são os favoritos -, alguns petistas fazem espécie de “pré-campanha” e usam nos bastidores o argumento de que Cunha é beligerante, desagregador e não teria o equilíbrio necessário para pautar as matérias, seja atendendo aos interesses do Planalto, seja da base. Por isso mesmo, para o PT, quem não ajudar agora, não terá legitimidade de cobrar nada do governo depois.

Dois partidos preocupam os petistas: PP e PTB. O primeiro, apesar de ser da base, parece sensível às investidas de Cunha e até ao argumento do líder da bancada do PMDB de que a eleição apertada é um sinal claro de que o PT não pode ter o monopólio sobre o Executivo e o Legislativo. Isso embora o PMDB hoje tenha o monopólio do Legislativo ao presidir Câmara, com Alves, e Senado, com Renan Calheiros (AL). O PTB, cuja bancada é majoritariamente dilmista, apoiou Aécio Neves (PSDB-MG) na disputa presidencial e terá a influência de Benito Gama (BA), eleito para a próxima legislatura. Até petistas reconhecem que o PTB é suscetível.

O Planalto não descarta a possibilidade de Cunha estar jogando com as circunstâncias. Ou seja, o governo não duvida que o líder da bancada sonha em controlar a pauta de votação da Câmara ao assumir a presidência da Casa, mas acha que o afinco do deputado fluminense pode ocultar outras intenções levando a disputa ao limite máximo, para então abrir mão após receber sinal verde para indicações ministeriais, por exemplo, ou nomeações em estatais.

O PR é um partido que poderá pender para a esfera petista nessa disputa. Apesar de compor a base, não está fechado com o PT e tem no PMDB um aliado. Acontece que Anthony Garotinho (PR-RJ), que foi derrotado na disputa estadual no Rio de Janeiro, deverá exercer influência na bancada por meio de sua filha, Clarissa Garotinho, eleita deputada. Adversários no Rio, Cunha e Garotinho não deverão estar do mesmo lado. Nesse sentido, o PT pode acabar ganhando o apoio do PR para a disputa da Mesa.

Jogo de cena

Há quem veja no embate entre PT e PMDB um grande jogo de cena cuja motivação seria alijar a oposição do páreo. Miro Teixeira (PROS-RJ) acredita que os dois partidos criam um ambiente beligerante apenas para criar a ideia de disputa feroz que no final desse processo seria coroado com um grande acordo para a escolha de um nome que, se não for de consenso, não chegaria a desagradar a nenhum dos lados.

“Está havendo um mecanismo de imobilização da oposição”, diz Teixeira. “Não me sentiria à vontade de ser colocado entre aqueles que acreditam que haverá uma disputa entre PT e PMDB”, provoca o deputado fluminense. Teixeira acredita na possibilidade do surgimento de uma quarta corrente que de sustentação a uma candidatura baseada em propostas e não num nome. Ele diz que um grupo ainda pequeno, mas em crescimento, defende que o futuro presidente da Casa seja definido com base num conjunto de propostas, para que então se defina um nome.

Utopia ou não, ele diz que sustenta sua tese baseado em observação , análises retrospectivas e na relação das pessoas no parlamento. “Não acredito que o Michel Temer, com a responsabilidade que tem, permitirá que o PMDB se lance numa crise de enfrentamento com o principal partido da base”, pondera ele. De fato, Temer é considerado um aliado dentro do PMDB e nos últimos dias tem feito gestos claros para tentar esvaziar o pleito de Cunha.

Embora o vice-presidente da República já tenha dito a aliados que concorda com a ideia de que é preciso tensionar o PT no segundo mandato, apesar de seus interlocutores reforçarem esse nova linha de atuação do presidente nacional do PMDB, na prática Temer tentou esvaziar a reunião do PMDB, que na semana passada deu sinal verde para Cunha articular sua candidatura a presidente da Câmara.

Oposição

Com exceção do PSOL, partidos declaradamente da oposição prometem caminhar juntos para a escolha do novo presidente da Câmara. A grande dúvida deste grupo é saber qual o candidato que terá melhores condições de derrubar o nome petista na disputa. Por isso, PSDB (54 deputados eleitos), PMN (3 deputados eleitos), SDD (15 deputados eleitos), DEM (22 deputados eleitos) e PPS (10 deputados eleitos) estão com um olho no padre e outro na missa. Fazem gestos para Júlio Delgado, mas afagam Eduardo Cunha.

“Vamos escolher o melhor caminho para derrubar o governo”, sintetiza o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), que não foi reeleito. “O que não podemos fazer é voltar à condição de subordinação ao Executivo que vivemos nos últimos anos”, pondera ele. “A pergunta é: quem terá condições de derrubar o governo?”, questiona Freire, que verbaliza publicamente aquilo que tucanos defendem de forma mais reservada. O PSDB prefere o discurso mais contido agora para não fechar as portas de nenhuma possibilidade. Quer manter bom diálogo com Cunha, mas também não abre mão de ter num nome próprio sua carta na manga.


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