BRASIL

ENTREVISTA: Presidente do CONFEA revela os bastidores da tramitação de matérias relativas ao futuro da engenharia, no Congresso Nacional

Um dos principais destaques da nova edição, de nº 172, da Revista NORDESTE é a entrevista com o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), Joel Krüger, que avalia a atual conjuntura política e econômica brasileira, e revela os bastidores e possíveis cenários relativos à tramitação de matérias importantes que envolvem o futuro da engenharia, no Congresso Nacional.

A nova edição da NORDESTE já está disponível para leitura virtual no site da Revista (www.revistanordeste.com.br) e também no Portal WSCOM. (CLIQUE AQUI para acessar).

Leia a matéria na íntegra:

O TIMING DE MAIS LUTAS DA ENGENHARIA BRASILEIRA EM TEMPO DE MUITOS DESAFIOS

Presidente do CONFEA avalia conjuntura, revela cenários de inquietação no Congresso Nacional e projeta futuro da engenharia

Por Walter Santos

O presidente do CONFEA, Joel Krüger, anda com sua agenda tomada de compromissos que lhe levam a acompanhar atentamente muitas matérias polêmicas no Congresso Nacional a afetar a engenharia e sua representação legal, da mesma forma que ainda vive criando situações para o sistema da engenharia se mantenha modernizado para conter os efeitos da conjuntura e da pandemia. Eis a entrevista do dirigente, a seguir:

Revista NORDESTE – O Brasil convive desde 2020 com a mais forte pandemia de todos os tempos, já passando de 330 mil óbitos. De que forma a Covid afetou a engenharia e a agronomia em termos efetivos, de números econômicos?

Joel Krüger – A economia foi bastante afetada em todas as regiões do país. Claro que por consequência as atividades relacionadas a nossas profissões também sofreram. Porém, o impacto não foi tão significativo. Em 2019 o Sistema Confea/Crea emitiu mais de cinco milhões de ART, Anotações de Responsabilidade Técnica e realizou mais de 500 mil fiscalizações. Em 2020, mesmo com a saída de profissionais de nível médio do nosso Sistema e com a pandemia os números ainda não totalmente consolidados não apontam uma queda significativa. Isso é explicado por nossas profissões terem sido consideradas desde o início da pandemia como serviço essencial. Tivemos uma demanda grande por tecnologia, por acesso a internet, por smartphones e computadores mais sofisticados. No entanto, os maiores impactos, sem dúvida, referem-se às vidas perdidas, um prejuízo imensurável e irreversível que não poupou vidas de toda a sociedade, incluindo profissionais da Engenharia, Agronomia e das Geociências. Muitos desses profissionais chegaram a contribuir para a redução dos impactos sociais da pandemia e, infelizmente, sucumbiram à infecção.

NORDESTE – Conceitualmente e pragmaticamente, como o passado recente no País, afetado por operações do nível da “Lava Jato”, atingiu o mercado da engenharia em nível nacional e internacional? Ao que parece, perdemos a competitividade no exterior…

Joel Krüger – As grandes empresas de engenharia brasileiras foram consideravelmente afetadas neste sentido. Empresas públicas como a Petrobras, maior empresa brasileira, tiveram sua imagem fortemente afetadas, com consequente perda de investimento. Ao mesmo tempo, o setor de engenharia também foi duramente afetado, com paralização de muitas obras e o desmonte ou a falência de grandes empresas. Somos totalmente contrários a qualquer forma de corrupção, mas entendemos que as pessoas acusadas de atos lesivos deveriam ser afastadas de suas funções. Porém é importante a preservação das empresas, que geram milhares de empregos e não poderiam ser responsabilizadas por atos de pessoas. Temos uma necessidade absurda por infraestrutura, de pesquisa, de desenvolvimento. Tudo isso foi duramente afetado e, sem dúvida, o Brasil vem perdendo competitividade. Há dez anos, tínhamos uma perspectiva bastante otimista para a engenharia, com alta procura e abertura de vagas em universidades de cursos na área. Infelizmente hoje o cenário não é esse.

NORDESTE – Do ponto-de-vista orgânico, como os efeitos da pandemia foram sentidos no Sistema Confea/Crea e Mútua, a partir dos Conselhos Regionais? A inadimplência chegou a que estágio?

Joel Krüger – Como disse anteriormente, nossas atividades não sofreram uma grande perda de arrecadação. Desde o início da pandemia foram tomadas ações para minimizar os impactos junto aos nossos profissionais. As anuidades não sofreram qualquer tipo de reajuste e os prazos para o pagamento das mesmas foram estendidos. Dessa forma, os níveis de inadimplência também não sofreram alterações significativas.

NORDESTE – Dentro deste contexto, quais os desafios mais urgentes do sistema representativo da categoria?

Joel Krüger – É importante que a engenharia brasileira volte a ser protagonista e tratada como prioridade. Um exemplo de como o trabalho de nossos profissionais pode ajudar o desenvolvimento do país é a agricultura. Tivemos uma revolução nesse segmento nos últimos 50 anos. Saímos de importadores de alimentos para sermos exportadores e um dos players importantes no cenário mundial. E esse aumento da produtividade agrícola brasileira veio com a tecnologia, com o uso de técnicas de manejo sustentável do solo, de novas máquinas e equipamentos. E isso é fruto do trabalho de nossos profissionais. A engenharia brasileira já viveu uma grave crise nos anos 80 e 90 do século passado. Não podemos ficar mais uma década patinando, o Brasil tem enorme potencial para uma indústria de alta tecnologia. Temos dialogado com o governo federal e ministérios neste sentido. Precisamos interferir mais. Qual o projeto de Brasil que a gente quer? A engenharia é, acima de tudo, resolver problemas. É transformar e construir qualidade de vida com sustentabilidade.

NORDESTE – Como o ensino e a formação de novos profissionais têm sido afetados nesta nova fase?

Joel Krüger –
A pandemia demonstrou que é inevitável a valorização do ensino a distância. Essa modalidade de formação dos profissionais ainda apresenta muita resistência de um lado, e um açodamento ainda preocupante, de outro. Ainda precisamos descortinar um diálogo maior no Sistema e com o ministério da Educação para definir os rumos dessa compatibilização, mas a certeza que temos hoje é de que não é mais possível deixar de lado essa ferramenta. Temos feito trabalhos internos, preocupados ainda com a certificação profissional e a acreditação de cursos, mas também avançamos muito ao participar junto das discussões com o Conselho Nacional de Educação – CNE quanto às Novas Diretrizes Curriculares da Engenharia e da Agronomia. Esse processo ainda está em continuidade, mas estamos certos de que obteremos bons resultados, o que retoma o ciclo de discussões sobre o EaD, demonstrando ainda a necessidade de continuarmos marcando a nossa posição e de aprofundarmos as nossas considerações a respeito desses parâmetros.

NORDESTE – É no Congresso Nacional onde tramitam muitas matérias a afetar o conjunto da Engenharia e Agronomia nacional. Quais os projetos de lei que mais preocupam a classe representativa e dirigente do setor?

Joel Krüger – Partindo do ponto positivo primeiramente, chamo a atenção para o PLC 13/2013, que cria a carreira de Estado para Engenheiros, Arquitetos e Engenheiros Agrônomos ocupantes de cargo efetivo no serviço público federal, estadual e municipal, e ainda ao PLS 303/2018, que institui a Engenharia, Arquitetura e Urbanismo Geral da União. Seria uma enorme valorização para os engenheiros que atuam no serviço público e a demonstração de valorização de nossas profissões. Temos imensas demandas e nossas profissões sofrem ataques diversos. Um deles é a Proposta de Emenda à Constituição 108/2019 que pretende tornar os conselhos entidades jurídicas de direito privado e tira o poder de polícia dos conselhos profissionais, não podendo exercer a sua atividade precípua, a fiscalização. Isso prejudica toda a sociedade. Outro ponto é que ela desobriga os profissionais de realizarem suas inscrições nos respectivos conselhos, apostando na desordem, a custo econômico e social alto, precarizando os serviços e gerando ainda mais insegurança. Nessa linha, somos favoráveis à aprovação do Projeto de Lei 6699/2002 que criminaliza o exercício ilegal das profissões de engenheiro, arquiteto e engenheiro agrônomo.

NORDESTE – O Estado tem se apresentado ao longo do tempo como indutor da produção, a exemplo do programa “Minha Casa, Minha Vida”, ultimamente desaquecido. Como o CONFEA analisa o governo atual no fomento econômico de setores como a engenharia?

Joel Krüger – É preciso investir com mais assertividade no setor da construção civil, que apresentou déficit de 2,5% do PIB do ano passado, segundo o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O programa que substituiu o Minha Casa, Minha Vida, lançado no ano passado, o Casa Verde e Amarela, tem sido debatido pelo Confea. Fizemos um termo de cooperação técnica com o ministério do Desenvolvimento Regional para a prestação de serviços de assistência técnica para famílias de baixa renda por meio do programa Casa Verde e Amarela. Esperamos que o mesmo tenha êxito em reduzir o déficit habitacional com qualidade e acompanhamento técnico.

NORDESTE – O que dizem os estudos existentes sobre a retomada da produção e economia na ótica e interesse do CONFEA?

Joel Krüger – A expectativa do setor seria de que houvesse uma mudança, sinalizando a revisão de uma postura mais condizente com as necessidades do setor produtivo, que continua sem ser efetivamente ouvido pelo governo. Temos nos mantido abertos ao diálogo. Também tomamos a iniciativa de criar um Ciclo de Debates sobre Engenharia e Infraestrutura, no qual temos ampliado a nossa atuação junto aos ministérios, inclusive por meio de Acordos de Cooperação Técnica. Foi por meio desse diálogo que acabamos convencendo o governo da necessidade de descontinuar a Resolução nº 64, do ministério da Economia, voltada à implementação do piloto do Licenciamento Urbanístico Integrado para liberação de alvará de construção, bem como do habite-se – documento de autorização para uso e ocupação da edificação – para atividades consideradas de baixo risco. A proposta acabou sendo revogada, durante o diálogo mantido com o setor. E agora estamos discutindo bastante a Resolução nº 4.754/2019, editada pelo Banco Central – Bacen e que dispensou a necessidade de perícia de engenharia para financiamento de imóveis. Há ainda outras linhas de negociação, inclusive junto ao Congresso Nacional, apesar das dificuldades de manter a intensidade das atividades parlamentares, diante da pandemia. Portanto, temos procurado manifestar nosso posicionamento por meio de uma atuação ancorada na participação de todos os profissionais, das empresas e de todas as lideranças do Sistema.

NORDESTE – Qual a mensagem que resta a todos os segmentos da área na direção do futuro?

Joel Krüger – Estamos unidos e conscientes das dificuldades que ainda iremos enfrentar, mas essa é uma rotina que faz parte da própria essência da Engenharia, da Agronomia e das Geociências: somos movidos a desafios. Esse é um momento de prepararmos novamente as bases para que possamos alcançar novamente rumos para o crescimento. O Confea em conjunto com todos os Creas e entidades de classe representativas de nossas profissões estão dispostos a colaborar e fazer com que a engenharia, a agronomia e as geociências sejam os propulsores deste desenvolvimento.


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