BRASIL

Marina Silva defende que políticos denunciados por Janot devem ser afastados

Afastada dos holofotes desde o fim das eleições presidenciais, a ex-senadora Marina Silva, que ficou em terceiro lugar na corrida eleitoral, com 22,1 milhões de votos, escreveu um artigo defendendo que os políticos denunciados formalmente nos processos da Operação Lava Jato pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sejam afastados dos cargos.

A ex-ministra publicou o artigo “Justiça a tempo” [reproduzido abaixo] no Blog do colunista Matheus Leitão, hospedado no G1.

No artigo, Marina defende que a sociedade exija o afastamento dos políticos que ocupam cargos públicos e são alvo das investigações. “Quando as investigações resultarem em provas e denúncias formais ao Supremo Tribunal Federal, devemos exigir o afastamento dos que ocupam cargos cujos poderes possam interferir nas decisões. Mas desde já precisamos estar atentos contra qualquer tentativa de sabotagem”, alerta a ex-senador.

A crise instaurada entre o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) e o Congresso Nacional – personificado na figura do presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – também é alvo dos comentários de Marina. Para ela, “boa parte dos que saem gritando ‘fora Cunha’ parecem querer apenas aproveitar a oportunidade de apontar um novo inimigo público para desviar a atenção dos gritos de ‘fora Dilma'”.

Marina aponta que a responsabilidade pela crise político-econômica no Brasil deve ser repartida entre o Congresso Nacional o governo. “Neste momento, deveria predominar entre eles a consciência de que o Poder Legislativo é maior que seus membros, mesmo aqueles que ocupam cargos de direção”, afirmou a ex-senadora, num claro recado a Eduardo Cunha.

Na última sexta-feira (17), horas depois de oficializar o rompimento político com o Palácio do Planalto, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, autorizou CPIs que contrariam o governo. Ele afirma que a decisão não tem caráter revanchista.

AÇÃO DA PF – Na última terça-feira (14), a Polícia Federal realizou buscas em residências e escritórios de políticos investigados sob suspeita de envolvimento com o esquema de corrupção descoberto na Petrobras pela Operação Lava Jato.

A ação policial representa a primeira ofensiva contra esses políticos desde março, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a abertura de inquéritos sobre 13 senadores e 22 deputados federais acusados por participar do esquema de corrupção.

 

Leia a íntegra do artigo enviado ao Blog por Marina Silva:

Quem ainda tem esperança de um mundo e de um Brasil melhores deve manter neste momento uma grande atenção nas conquistas democráticas e apoiar com firmeza o trabalho da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça. O que está em curso no Brasil não é apenas a desconstrução de um sistema político que revela, a cada dia, sua falência. Há também uma lenta construção da democracia e de instituições independentes e fortes, instrumentos de navegação em meio às crises.

Assim como saímos do impeachment de Collor para outro ciclo de evolução, com a estabilização econômica nos governos de Itamar e Fernando Henrique, que possibilitou avanços sociais no governo Lula, da mesma forma podermos ser capazes de sair da crise atual para outro momento positivo. Para isso, entretanto, devemos cuidar de manter as bases institucionais democráticas que construímos a duras penas e, como diz o ditado popular, não jogar a criança fora com a água suja.

Aparentemente, há apenas sujeira. Mas devemos ver além das aparências, ou seja, além da crise e da confusão política que se profundam e crescem. Na realidade, as novidades são poucas. A crise é a mesma e todos os envolvidos nela já faziam o que fazem e diziam o que dizem – com os mesmos maus resultados na vida do povo brasileiro – há vários meses. Os rompantes dos dirigentes políticos e as manifestações de seus seguidores, a histeria na guerrilha virtual, as justificativas diante das denúncias, tudo igual.

Num artigo que escrevi há alguns meses, quando reclamavam que eu estava em silêncio, mostrei que continuava participando da vida política brasileira com os poucos meios que tenho à minha disposição. Naquela ocasião afirmei: “basta olhar o ambiente político para ver que tudo serve à manipulação, que o objetivo não é sair da crise, mas usá-la”. Isso também continua.

Se a manipulação da crise foi o modo como o presidente da Câmara encontrou para aumentar seu poder, é normal que ele agora tente explicar as denúncias de corrupção que recebe como sendo manipulação dos outros – o governo, no caso. Não há novidade nisso e boa parte dos que saem gritando “fora Cunha” parecem querer apenas aproveitar a oportunidade de apontar um novo inimigo público para desviar a atenção dos gritos de “fora Dilma”.

O Congresso Nacional divide com o governo as responsabilidades pela crise e a atenção pública se volta para os parlamentares. Neste momento, deveria predominar entre eles a consciência de que o Poder Legislativo é maior que seus membros, mesmo aqueles que ocupam cargos de direção. Como poder independente, deve respeitar a independência dos demais poderes e avaliar suas ações em conformidade com a Constituição Federal.

Repito o que disse há pouco mais de uma semana, numa nota pedindo apoio aos órgãos de investigação e do sistema judiciário: “a confiança vigilante nas instituições é a melhor maneira de evitar precipitações ou aventuras”. Precisamos estar alertas contra a manipulação política de qualquer lado e contra todas as formas de pressão e intimidação sobre a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal.

Quando as investigações resultarem em provas e denúncias formais ao Supremo Tribunal Federal, devemos exigir o afastamento dos que ocupam cargos cujos poderes possam interferir nas decisões. Mas desde já precisamos estar atentos contra qualquer tentativa de sabotagem.

Aos denunciados resta rever suas práticas e posturas. Ao menos em nome do bom senso impõe-se evitar mexer mais ainda num equilíbrio institucional que já está precário, não usando poderes públicos como navios de guerra de onde os litigantes disparam contra os outros.

Obviamente, ninguém mais espera um comportamento minimamente virtuoso da maioria dos personagens no palco da política brasileira dos dias atuais. Mas se temos que respeitar as instituições que eles, infelizmente, dirigem tão mal, e respeitar a população que lhes confiou seu voto, temos também que manter viva nossa esperança de que a Justiça será feita e os erros serão punidos. Afinal, como disse Rui Barbosa, “a Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada”.

Que o epílogo desse drama, quando ocorrer, seja o prólogo de uma nova história de afirmação da democracia no Brasil.

Ne10


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