BRASIL

PT vai à caça de inadimplentes do partido e cobra dívida de até R$ 180 mil

Para disputar mandatos eletivos, petistas inadimplentes com o dízimo do partido tiveram que correr para acertar os pagamentos que andavam atrasados. Em uma administração considerada “linha dura” em relação às finanças, não houve alegações de “viabilidade política da candidatura”, “aperto devido a pensões alimentícias”, “dívidas com as campanhas anteriores” ou qualquer outra desculpa, que se sobrepusessem à exigência de estar em dia com a contribuição partidária para ter a candidatura homologada pela legenda.

O senador Lindbergh Farias (RJ) foi um dos que precisou negociar a dívida para ter condições de lançar sua candidatura ao governo do Rio de Janeiro. Lindbergh devia contribuições referentes a 20% do salário líquido que recebe como senador, desde o início do mandato, em 2010.

A dívida de Lindbergh acumulava cerca de R$ 180 mil. A solução foi dividir e se comprometer com o partido com o pagamento de três parcelas de R$ 60 mil. O salário de um senador é atualmente R$ 26.512,09.

Integrantes da direção do PT já se dizem acostumados com a choradeira pré-campanha. De acordo com o estatuto do partido, quem não está em dia com o dízimo do PT não pode ter sua candidatura registrada, não pode também votar no processo de eleições internas para escolha dos dirigentes, além de não poder ainda votar nas resoluções apreciadas nos congressos e convenções do partido.

As desculpas são as mais variadas. Tem até gente que alega ter três pensões alimentícias para pagar. Outros filiados reclamam de gastos excessivos nas campanhas anteriores. Mesmo assim, para evitar constrangimentos, em 2010, uma decisão tomada pelo congresso do partido fez com que a cobrança dos atrasados saísse da esfera dos diretórios estaduais e passasse a ser tratada pela direção nacional. Foi uma forma encontrada pelo partido para dar um caráter mais impessoal à cobrança.

Mercado

O estilo mais fechado do atual tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, mantém a discrição sobre as cobranças, no entanto, ele tem se empenhado na ofensiva para aumentar a arrecadação. Bancário e sindicalista, Vaccari, dizem petistas próximos, adotou a prática do mercado de busca pelos maus pagadores para colocar as contas do partido em dia. Isto tem lhe rendido fama excelente arrecadador.

Um exemplo desta ação está na montagem de stands para negociação das dívidas nos congressos, convenções, encontros, reuniões e eventos organizados pela direção nacional. Sempre há nos eventos um funcionário do Sistema de Arrecadação de Contribuição Estatutária (Sace), órgão do PT para controle das contribuições, para atender os aflitos e tentar negociar uma forma de pagamento dos atrasados. Quem consegue fechar negócio, pode até recobrar imediatamente o direito ao voto nas convenções e congressos.

Crediário

A deputada Dalva Figueiredo (PT-AP) também teve que correr para negociar o dízimo atrasado, segundo ela, durante os dois últimos anos. Candidata à reeleição, Dalva acabou saindo da direção do PT nacional com um crediário de 10 parcelas.

“Pelo menos eu tinha crédito para negociar porque sempre paguei corretamente”, ressalta a deputada que assumiu as prestações em torno de R$ 2 mil reais. “As prestações cabem no meu salário”, comemorou.

O desequilíbrio nas contas que levaram a inadimplência, segundo a deputada, foi provocado pelos gastos com sua campanha em 2008, à prefeitura de Macapá, além de problemas particulares de saúde em sua família.

Sem vencer as eleições, restou à deputada dívidas da campanha e as dificuldades de honrar os compromissos com seu partido. “Eu e vários deputados negociamos nossas dívidas. Uma campanha majoritária não sai barato e esse é um dos motivos que eu defendo a urgência de se fazer uma reforma política no Brasil. Não podemos ter eleições tão caras”, disse a deputada que é candidata à reeleição.

“Uma campanha majoritária sai muito cara e, por ter sido uma decisão pessoal, assumi meus gastos. Já fui candidata ao governo do Amapá, em 2002, mas como minha candidatura era estratégica para o partido, o PT me apoiou”, ponderou.

A deputada se disse a favor do financiamento público de campanha, bandeira defendida pelo PT na reforma política. “Pelo menos eu não tenho que ficar pedindo doações para ninguém”, ressalvou a deputada.

Outro filiado que precisou negociar sua dívida para se lançar na campanha pela reeleição foi o deputado Weliton Prado (MG).

Estatuto

As contribuições obrigatórias dos filiados já foram proibidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 2011. Mesmo assim essas contribuições representam boa parte da arrecadação global do PT e de outros partidos. O pagamento e as restrições impostas aos devedores estão expressos no estatuto do PT.

De acordo com o texto petista, “os recursos financeiros do Partido dos Trabalhadores serão originários de contribuições obrigatórias de seus filiados e filiadas na forma deste Estatuto; contribuições obrigatórias dos filiados e filiadas ocupantes de cargos eletivos, de confiança e dirigentes na forma deste Estatuto”. Além disso, o estatuto do partido também prevê “contribuições espontâneas de filiados ou filiadas e simpatizantes”.

Arrecadação recorde

Na gestão da presidente Dilma Rousseff, o partido arrecadou R$ 49,7 milhões com as contribuições partidárias, batendo o recorde de arrecadação da legenda na receita com contribuições.

A cifra, que superou as marcas conquistadas no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, consta na última prestação de contas apresentada pelo partido à Justiça Eleitoral em abril deste ano. Só em 2013, as contribuições de filiados representaram 20% das receitas do diretório nacional, somando R$ 32,6 milhões, recorde para um ano não eleitoral.

A maior parte da receita do partido é de doações de empresas que, em 2013, também bateu recorde em um ano não eleitoral. Foram R$ 79,7 milhões captados de empresas, 57,3% a mais que o registrado em 2011.

A próxima prestação de contas do PT será feita no segundo semestre à Justiça Eleitoral. O partido não informou sobre a expectativa de arrecadação, nem sobre a estimativa de impacto das negociações sobre as receitas com a contribuição dos filiados.

Tabela

Para definir o valor a ser pago pelos filiados, a tabela de contribuições do partido adota uma progressividade na cobrança e sofreu ajustes em 2013, durante o 5º Congresso do partido. De três categorias, a tabela passou a ter cinco categorias de contribuintes.

A primeira é formada por filiados que não ocupam cargos cuja contribuição parte de R$ 15 semestrais. A segunda é composta por petistas eleitos que devem contribuir mensalmente com 6% a 20 % de seus vencimentos, dependendo do valor. Neste rol estão ministros, senadores, deputados federais cuja contribuição pode superar R$ 3,5 mil mensais.

Há ainda duas categorias formadas por ocupantes de cargos de confiança nas administrações públicas estaduais e municipais, e outra para funcionários em cargos federais, cujas contribuições variam de 2% a 10% de seus vencimentos. A quinta categoria é formada por filiado membro da direção do partido que contribui com 1% sobre o salário líquido.

Procurados pela reportagem, o senador Lindberg Farias e o deputado Weliton Prado não responderam às ligações.


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