PERNAMBUCO

Recifenses vivem situação dramática após perderem tudo em deslizamentos

A aposentada Marinete de Queiroz, 65 anos, estava deitada quando ouviu, na tarde de segunda-feira, o aviso aflito de uma vizinha: a barreira abaixo de sua casa estava cedendo. Além da casa dos vizinhos que moravam logo após a sua, na Rua Capelinha, no Alto da Areia, Zona Norte do Recife, o barro levou boas lembranças de uma vida e o sonho de envelhecer no endereço que já ocupava há 42 anos e no qual criou seus sete filhos.

Assim como a de Marinete, 572 famílias tiveram que deixar seus lares, assombradas pelo risco do desabamento. Como não foram saídas emergenciais, essas famílias ficam em um limbo: não recebem abrigo da prefeitura, mas são orientadas a procurar a casa de parentes e amigos para um teto seguro. Em seguida, caso as casas sejam condenadas pela Defesa Civil, podem pedir auxílio moradia, que desde de 2013 é de R$ 200.

"O povo da vizinhança diz que é para eu ficar, mas depois cai tudo e aí?", questiona a idosa, que se emociona diversas vezes enquanto explica que não dormirá na casa nenhuma noite a mais. "Minhas filhas arrumaram uma casa emprestada até entrar no auxílio da prefeitura e até a gente fazer a mudança (na quarta-feira) eu durmo em uma vizinha", conta, em tom de lamento. "A casa é simples, mas era o meu canto", orgulha-se. "Parece que a Defesa Civil vai demolir", diz, sem certeza e com a voz embargada. 

Nos cômodos da casa, dividida em três e onde morava com duas filhas e o companheiro de uma delas, as rachaduras mostram a violência com a qual a barreira – revestida de cimento – cedeu. O maior medo de Marinete, no entanto, foi quando olhou pela janela e viu o que sobrou da casa dos vizinhos, abaixo da sua. "Pensei que Weyzi tinha morrido", diz, novamente se emocionando.

Marinete se refere à recepcionista Weyziana Santos, de 20 anos, cuja casa foi totalmente destruída pelo barro, que encobriu roupas, eletrodomésticos e a mobília, comprada há cerca de uma semana. Medicada, ela não teve condições de conversar com a equipe de reportagem do Diario, recebida por sua mãe, Ana Paula Santos, 41, que há 30 dias deixou o endereço, com medo justamente da barreira desabar. "Eu insisti para ela vir com a gente, mas ela ficou, estava cuidando da casinha dela, se organizando. Ela estava trabalhando na hora, mas eu estou desempregada, se eu tivesse em casa com meus filhos, quantas pessoas teriam morrido?", conta, nervosa. 

Ao lado da casa de Weyziana – no terreno deixado pela avó – vivia outra parte da família, composta por uma tia, o companheiro dela e filhos. Ana Paula conta que um dos jovens, João Vitor, passou na casa dela para buscar um cartão VEM antes de seguir para a casa onde ele morava, mas ela conseguiu impedí-lo de seguir viagem. "Eu disse que estava chovendo e ele queria dormir depois do almoço, mas não deixei, mandei ficar aqui”, conta, indo às lágrimas ao revelar que o quarto dele foi totalmente destruído pelo barro. "Ele ia morrer", acredita.

Defesa Civil responsabiliza Compesa 

Diante dos destroços provocados pela lama, as famílias agradecem a atenção dada pela Defesa Civil do Recife, que distribuiu cestas básicas e colchões em caráter emergencial. Em busca de respostas definitivas, no entanto, elas ainda não sabem como será o futuro.

"A Defesa Civil disse que, nesse caso, a culpa foi de um cano da Compesa, que estava encharcando a barreira por dentro", conta Marinete, sem saber a quem recorrer. "E agora, como eu procuro a Compesa?", questiona-se Ana Paula, lamentando a perda do terreno passado por gerações.

Segundo a Compesa, no entanto, a companhia fecha o fornecimento de água em áreas de risco imediatamente diante do mau tempo. Neste caso, no momento da queda da berreira, o fornecimento estaria interrompido, o que não justificaria o desabamento. 

"Quando Dilma sair"

Do outro lado da Rua Capelinha mora o casal Natalício Barbosa e Girlene Nunes. No quintal da casa, localizado entre uma barreira e a lateral de uma escadaria, as pedras que ligam a moradia às escadas já começaram a ceder e o risco de desabamento assusta. "Moramos aqui com nossos filhos, já chamamos a Defesa Civil tem um mês e até agora nada", reclama a dona de casa.

Nesta terça-feira, diante de uma visita dos técnicos à vizinhança, Natalício Barbosa aproveitou para chamar atenção de um engenheiro que fazia uma vistoria no local e se surpreendeu com a resposta. "Eu disse a ele que se eles não fizerem nada eu mesmo vou fazer, porque não vou esperar o pior. Ele me disse que só "quando Dilma sair"", conta, revoltado.

Balanço da Defesa Civil

Segundo a Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac), nas últimas 36 horas choveu 210mm no Recife, o que equivale, diante da média histórica, ao esperado para o período de 21 dias.

Segundo a Defesa Civil, 15 mil pessoas moram em áreas de risco na cidade e foram informadas via SMS sobre as previsões de chuva e alagamentos. Ao todo, 106 casos de deslizamentos de barreira foram registrados e ninguém ficou ferido. A Zona Norte é a área mais atingida da cidade.

A Defesa Civil pode ser acionada pelo 0800 081 3400. 

Diário de Pernambuco


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