BRASIL

Revista NORDESTE: Incógnita e violência na disputa pelo Poder

Cientista Político avalia que governo impopular de Michel Temer, impedimento para que Lula possa ser candidato e grande foco em candidatos à direita devem marcar um dos cenários eleitorais mais violentos dos últimos anos no país

Por Paulo Dantas

O prof. dr. Vitor de Angelo Amorim é coordenador do programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Vila Velha, no Espírito Santo. Na entrevista concedida com exclusividade à Revista NORDESTE, Amorim faz análise do momento atual e vê semelhanças na disputa eleitoral do próximo ano com Era Vargas.

Revista NORDESTE: Qual a sua avaliação da situação do Brasil após a deposição de Dilma Rousseff e já completando um ano do governo de Michel Temer?
Vitor Amorim: A crise econômica persistiu, mas tende a mostrar sinais de arrefecimento, o que já estava mais ou menos claro desde o final do governo Dilma. Do ponto de vista político, o governo também não é uma surpresa. São conhecidas as figuras que estão no governo, e seu envolvimento nas investigações da Lava Jato também já estavam no horizonte. Do ponto de vista social, o governo impõe uma agenda liberal-conservadora, o que era claro em 2016. As reformas trabalhista e previdenciária, dentre outras medidas, mostram bem isso. Em síntese, não há surpresas. Talvez, surpreendente seja a profundidade, o alcance e a razoável facilidade para implementar essas mudanças.

NORDESTE: Finalmente foi realizada a fórmula para “um pacto para estancar a sangria” desejado por Romero Jucá no famoso áudio com Sérgio Machado?
Amorim
: Com certeza tentou-se fazer isso. Mas acredito que não conseguiram. Vide o envolvimento de vários integrantes do governo nas investigações.

NORDESTE: O presidente da Câmara Federal pediu parecer sobre a PEC 77-A, nas redes sociais esse movimento tem sido mencionado como possível manobra para adiar eleições de 2018. É possível que não haja eleições no próximo ano? Temer tem apoio político para isso?
Amorim
: O governo Temer é um dos mais mal avaliados da história brasileira. Socialmente, portanto, não caberia o adiamento de eleições, quando se sabe justamente que a maioria do eleitorado gostaria de escolher outro presidente a ter o governo Temer. Quanto mais a extensão deste governo. Porém, dada a facilidade que o governo tem tido para implementar sua agenda, e os apoios específicos de alguns setores – notadamente o empresarial -, o adiamento não surpreenderia. Contudo, junto com o impeachment de Dilma, seria, com certeza, mais um elemento a fragilizar nossa democracia.

NORDESTE: Qual a sua leitura sobre a oitiva realizada entre Sérgio Moro e Lula? Estamos vivendo uma espécie de antecipação do processo eleitoral?
Amorim
: Nós ainda estamos na eleição de 2014. Para quem achou aquela eleição violenta, é questão de tempo. Se Lula participar da eleição de 2018, teremos, certamente, a mais violenta eleição presidencial no Brasil recente. Comparável, talvez, à eleição de Getúlio Vargas, em 1950.

NORDESTE: Alguns analistas pró-Lula afirmam que o ex-presidente se saiu melhor no embate, outros apontam para Moro. Houve ganhador?
Amorim
: Acredito que não. Em pontos específicos, a "vitória" foi de um e de outro. Depende muito de quem analisa e do que é levado em conta na análise do depoimento.

NORDESTE: Boa parte da esquerda acredita que o processo vivido nos últimos meses têm acontecido para que a Lava Jato alije Lula do processo eleitoral de 2018, o senhor concorda com essa visão? É possível que Lula não consiga ser candidato em 2018?
Amorim
: É muito provável que ele não seja candidato, por causa da Ficha Limpa, que impede um condenado em segunda instância de se candidatar a cargo público. Há muita gente interessada nisso. Difícil é dizer se a máquina do Judiciário trabalha de maneira coordenada e, portanto, consciente, para esse fim. Mas dá no mesmo. Com a criminalização antecipada de Lula, sua ausência na eleição de 2018 é uma chance concreta. Isso tende a radicalizar ainda mais o processo eleitoral. Ainda mais se essa condenação em segunda instância acontecer perto da eleição, misturando as duas coisas – eleição e condenação.

NORDESTE: Os nomes que têm surgido para disputar a eleição presidencial apontam para mais à direita, é Jair Bolsonaro, João Dória, Geraldo Alckmin, Temer. Porque a direita parece melhor na foto?
Amorim: Por que vivemos uma crise das esquerdas, e porque o momento político-social é mesmo mais conservador.

NORDESTE: O ex-presidente FHC afirmou recentemente à BBC que o PT só tem Lula, enquanto o PSDB tem peças de substituição. O senhor concorda com essa análise?
Amorim: No caso do PT, concordo. No caso do PSDB, só se forem peças quebradas. José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves estão diretamente envolvidos ou em investigações da Lava Jato ou com o governo pessimamente mal avaliado de Michel Temer. Dória é uma exceção. Mais por ele do que pelo partido. Se lembrarmos que sua candidatura, há alguns meses, foi contestada pelo diretório municipal de São Paulo, então vemos que até para sair à prefeito ele não teve apoio da máquina tucana. Foi Alckmin, há época, que bancou seu nome.

NORDESTE: O filósofo Emiliano Queiroz afirmou à Revista NORDESTE que se orquestra no país uma quebra da esquerda e caminhamos para uma espécie de desamparo às leis trabalhistas, numa tentativa de tornar o Brasil parecido com a China, nesse quesito. O senhor concorda com essa afirmação? Esse seria um dos objetivos da direita?
Amorim: Acho que não podemos demonizar as mudanças propostas. Porém, o momento é ruim para um debate franco e aberto, as intenções não parecem ser as melhores, e, por tudo isso, fica claro que, a despeito de chamar de "modernização", os setores interessados na reforma sugerem querer mesmo uma "precarização repaginada". Não sei se à moda da China. Lá não é uma democracia. Não é possível contestar como aqui. A comparação me parece radical demais.

NORDESTE: Quais os nomes da esquerda que podem garantir um equilíbrio maior de forças no pleito de 2018, fora o Lula?
Amorim: Nenhum. Nem Lula. Temos olhado muito ou quase que exclusivamente para a eleição, que pode até ser vencida por Lula. Uma vez eleito, por exemplo, com quem ele governará? Sabe-se que, no Brasil, os presidentes são eleitos em minoria. Todos precisam formar coalizões. Com quem Lula – ou Ciro Gomes – formaria essa frente? Com o PMDB de Temer? Pode até ser. Mas, aí, não será um governo Lula para ser inflexão à agenda conservadora. Será um Lula repetindo o arco de alianças do governo de 2003-2010. Porém, sem os recursos econômicos da época, o que permitiu o apoio de amplos e diversificados setores.

NORDESTE: Se for realizada, qual a expectativa em relação as eleições de 2018? É possível haver uma mudança profunda na política do país, na Câmara e no Senado?
Amorim: Não acredito. Mesmo se houver grande renovação, o Congresso tende a ser mais do mesmo. Ou pior. Coloco em dúvida, inclusive, a amplitude dessa "renovação".

NORDESTE: O ambiente político atual lembra a eleição de Collor de Mello, quando o país buscava uma espécie de “salvador da pátria”. É possível que tenhamos um surpresa em relação a disputa de 2018? Na sua perspectiva, qual as chances de termos um nome completamente fora do atual jogo político como foi Collor?
Amorim: Em parte, lembra. Dos nomes até aqui apresentados, se a saída for Bolsonaro, então há uma diferença: o discurso de Collor era liberal-modernizador, e não liberal-conservador, com um quê de um militarismo e obscurantismo, como vemos em Bolsonaro. Mas se a alternativa for Dória, então a diferença é o tamanho do partido do presidente. Dória vem do PSDB, partido incomparavelmente maior do que o PRN de Collor.

 

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