BRASIL

Revista Nordeste: NE entra no mundo dos games

Brasileiros, além de jogar, começam também a desenvolver jogos, neste que é um dos ramos que mais cresce no mundo; Nordeste ensaia os primeiros passos na direção de criar um mercado e começa bem

Por Jhonattan Rodrigues

Cotado como um dos setores que mais movimenta dinheiro atualmente, o orçamento da indústria de jogos digitais, sozinha, já ultrapassa o ramo do cinema e música juntos. E as coisas só tendem a melhorar. Enquanto setores tradicionais do mercado estão sofrendo com a crise que se arrasta, a indústria de games vem tendo um aumento quase milagroso: a estimativa é que chegue a US$ 128 bilhões até 2020, segundo o site NewZoo, que anualmente libera uma pesquisa sobre o setor de jogos eletrônicos.

E no Brasil não é diferente, há sim, um mercado promissor. Estima-se em 61 milhões o público gamer no país. De olho nessa pequena mina de ouro, brasileiros começam a ter a iniciativa de passar de consumidores a desenvolvedores e se multiplicam no país empresas produzindo jogos. Mas nada de EA, Ubisoft ou Bethesda, empresas que movimentam milhões e contratam atores de hollywood para produzir jogos. Dentro desse enorme mercado de games, começam a ter expressividade pequenas empresas que são formadas por meia dúzia de pessoas, pouco orçamento, mas muita criatividade, que estão pondo a mão na massa e conquistando seu espaço. Esse é o mundo dos jogos indie.

Um mercado em potencial

Braid, Hotline Miami e Limbo são jogos que têm algo em comum: foram produzidos com orçamento na casa dos milhares, com equipes de no máximo 10 pessoas. A título de comparação, Horizon Zero Dawn, da Guerrilla Games, grande lançamento para PS4 de 2017, teve um orçamento US$47 milhões, com uma equipe de 250 pessoas, juntamente com mais 100 terceirizados.

O Brasil ainda está longe de uma realidade assim, mas o mercado de jogos indie é um território que está no começo de ser explorado. Com o surgimento de plataformas de distribuição online, como Steam e Xbox Live, os desenvolvedores passaram a ter uma opção para lançar seus jogos sem ter de passar pelas mãos de grandes distribuidoras. Para melhorar a situação dos brasileiros, foi lançado em 2015 o Splitplay, primeira plataforma online com foco para compra de jogos nacionais e latino americanos. Isso significa mais liberdade criativa, já que fora das pressões do grande mercado, com prazos mais estendidos e sem ter de atender interesses empresariais, o universo indie tem espaço para experimentar e usam e abusam da nostalgia, trazendo de volta à moda os jogos 2d e arcades, no estilo 8-bit do nintendinho ou mega drive. O aparecimento de novos softwares e a ascensão do celular como plataforma de jogos abriram ainda mais as portas para aqueles que querem viver de criar games.

Celular abriu espaço para novos desenvolvedores

Segundo a Associação Brasileira de Games (Abragames) o número de empresas desenvolvedoras de jogos no país aumentou 600% em oito anos. O I Censo da Indústria Brasileira de Jogos Digitais, realizado pelo Grupo de Estudos e Desenvolvimento da Indústria de Games (GEDIGames), em 2014, levantou dados de 125 desenvolvedoras de games e descobriu que 93 destas empresas, ou 74,4%, faturaram até R$ 240 mil em 2013, 75,2% tinham 10 ou menos pessoas e quase metade destas (59 empresas, 44,4%) possuíam até 5 pessoas, indicando que são empresas que se encaixam no perfil “indie”. O estudo indica também que a concentração das empresas está nas regiões Sul e Sudeste, sendo a maioria em São Paulo, com 54 empresas (36,24%), seguidos pelos estados do Rio Grande do Sul, 16 empresas (10,74%) e Rio de Janeiro, com 12 (8,05%).

Já no Nordeste, Pernambuco, em 5º lugar no ranking, tem 10 empresas (6,71%). Do Nordeste apareciam na lista ainda Paraíba, com 6 empresas (4,03% ), Bahia, com 5 (3,36%), Ceará com 4 (2,68%), e Piauí com 1 (0,67%). Um dos motivos para essa discrepância é que o São Paulo e a região Sudeste e Sul vêm investindo há mais tempo na área. O primeiro curso de ensino superior de desenvolvimento de games do Brasil, por exemplo, foi o da Universidade Anhembi Morumbi, inaugurado em 2003, que até hoje é uma referência na área. De lá para cá o número de cursos voltados para a área no Sudeste apenas aumentou. Inevitavelmente o Nordeste também entrou na onda e oferece estes cursos, principalmente em Pernambuco, Ceará e Bahia, mas também em outros estados. Na Paraíba, o campus da UFPB em Campina Grande é conhecido por ser um polo de tecnologia.

Quem já está na onda

Outro problema para o Nordeste é o cenário comercial ainda muito atrasado em relação ao Sudeste. Mesmo desenvolvedores de São Paulo atentam para o fato de que o mercado brasileiro ainda não leva muito a sério o ramo dos games, e no censo da Gedigames o índice de empresas que tinham como capital “recursos próprios, da família, ou de outros indivíduos” chegava a 64,7%. Há outras formas também, como incentivos fiscais do governo. O primeiro jogo financiado pela Lei Rouanet, Toren, da gaúcha Swordtales, e primeiro jogo brasileiro a ser lançado para PS4, foi lançado em 2015. Levou 4 anos para ser produzido, e teve um orçamento de R$ 400 mil. Ainda assim, os recursos captados através da Lei Rouanet vêm de empresas. A porcentagem de empresas nordestinas que captam recursos ainda é realmente baixa.

Porto Digital (PE) é um dos maiores parques tecnológicos do país

Como se percebe, no Nordeste, Pernambuco é a maior expressão no desenvolvimento de games. Recife é sem dúvida um dos maiores centros urbanos da região, um fator importante, mas além disso a cidade há tempos investe em tecnologia. Fundado nos anos 2000, o Porto Digital é uma zona de fomento à tecnologia e economia criativa no Recife antigo. Nela estão 260 empresas, onde trabalham 8.500 pessoas, gerando um faturamento anual de 1,4 bilhão de reais. Lá se encontram diversas incubadoras de startups e um ambiente tecnológico propício à troca de conhecimentos, o que a longo prazo beneficia toda a região.

A empresa Kokku, por exemplo, fez parte da produção de Horizon Dawn Zero, na criação de diversos personagens do jogo, incluindo alguns principais. Foi a primeira empresa brasileira a produzir conteúdo 3D em um jogo desse porte – chamados de AAA – para PS4. Segundo a empresa, foram mais de 60 mil horas de trabalho em uma equipe com mais de 20 pessoas, mostrando que o Brasil possui profissionais capacitados. Muitas dos que se deslumbraram com a beleza do jogo talvez não saibam que há mãos de nordestinos ali.

Quando for jogar, é bom ficar de olho em quem desenvolveu o game. Pode ser um desses estúdios abaixo:

 

Onanim Studio (CE)
A vantagem das empresas indie é a liberdade criativa. E isso a cearense Onanim soube aproveitar ao criar Traje Fatais jogo de luta inspirado nos clássicos de arcade como The King of Fighters, Street Fighter e Guilty Gear. Desenhado à mão no estilo pixel art, o enredo do jogo mostra convidados de uma festa à fantasia que recebem poderes especiais de uma misteriosa divindade cósmica. Os poderes variam, conforme a roupa que estão usando. Com uma meta de R$ 80.000 no site de financiamento coletivo Catarse, o game chegou a R$ 114.344. O game já foi aprovado na Steam Greenlight (onde os jogos mais votados são, publicados pela plataforma) e ganhou o prêmio de Melhor Jogo Brasileiro no Brasil Game Show 2016.

 

Bighut Studio (PE)
Os primeiros anos para uma empresa são cruciais, e muitas sentem dificuldade em conseguir financiamentos por não terem portfólio. Mas esse não é o problema para a empresa pernambucana Big Hut. Eles lançaram seu primeiro jogo, Dino Jump, em 2011, para celular e desde então não pararam mais. Boney: The Runner, Alien Jump, Candy Maze, Redneck Redemption: Zombie War, são alguns dos jogos da empresa, todos disponíveis no Google Play.

 

Manifesto (PE)
Fundada em 2005, em Recife, a Manifesto é uma das empresas beneficiadas pelo ambiente propício do Porto Digital. Veterana, a empresa começou em uma época onde o mercado brasileiro não era tão propício e apostou no mercado internacional. Hoje, segundo o site da empresa, acumulam 100 trabalhos concluídos entre jogos casuais, como o Fruit Inc., jogos infantis e os chamados serious games (jogos sérios), tipo de game desenvolvido com finalidades educativas. Seu portfólio inclui trabalhos para grandes marcas internacionais como a Disney e a Bandai Namco.

 

Narsvera (PB)
O estúdio de games de Campina Grande (PB), Narsvera, misturou a cultura nordestina com um dos heróis clássicos da DC e criou o Lampião Verde: A Maldição da Botija. Na trama Lampião, o ícone cangaceiro, já velho consegue poderes ao resgatar uma botija mágica. Parte então em uma luta para acertar contas do seu passado e proteger o Sertão Profundo do Bando das Visagens Malassombrosas. O jogo foi lançado pelo site de financiamento coletivo Kickante com a meta de R$ 30.000 e conseguiu arrecadar R$35.260,00 e agora está em desenvolvimento.

 

Prosperity Studios (PB)
Eles vêm produzindo Full Metal Wars, um jogo online para PC e com enfoque em competições. Full Metal Wars ganhou o prêmio Demonnight no BIG Festival do ano passado. O jogo faz uma junção bem inesperada de deuses nórdicos e robôs gigantes (chamados Ragnatron) e segundo o diretor da Prosperity Games, Miguel Oliveira, a ideia é construir um time de três robôs e desafiar os amigos. “No futuro, teremos torneios regionais, campeonatos nacionais, campanhas solo com modo história e muito mais”, conta.

 

Turtle Juice (BA)
Para quem curte jogos de estratégia no estilo tower defense (em que você deve construir armadilhas para evitar que inimigos avancem), vai se interessar por Fluffy Horde (algo como “horda fofinha”, em inglês), do estúdio baiano Turtle Juice. O jogo consiste em evitar em, diversas fases, que uma multidão de coelhos controlados por um feiticeiro maligno destruam seu país. O jogo ganhou o prêmio Excelência em Tecnologia e finalista em outras três categorias no Gamepolitan 2016 (melhor narrativa, melhor som, melhor arte). O jogo, que atualmente está desenvolvimento, foi ainda um dos vencedores do edital de games de 2016 da Spcine e foi aprovado pelo Steam Greenlight.

 


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