BRASIL

Revista NORDESTE: Tesouro escondido debaixo da rocha

A região Nordeste, entre todas do Brasil, é a que mais sofre com a falta de água. As bacias hidrográficas são menores, as chuvas são mais escassas, as secas, mais pertinentes. No Brasil existem 974 mil km² com clima semiárido, o mais seco do país. Desse total, apenas 12% se encontra no estado de Minas Gerais, o restante se distribui por oito estados do Nordeste, apenas Maranhão fica de fora. Períodos de estiagem prolongam-se por anos e os Governos precisam se desdobrar para levar água para toda a população, principalmente as que vivem no Sertão.

Uma alternativa para buscar água, no Nordeste ou qualquer outro lugar, é procurar embaixo da terra. Embaixo de toda a superfície da Terra existem águas subterrâneas. Em certas regiões essas águas formam aquíferos, onde é possível obter esse insumo para consumo humano. Mas mesmo embaixo da terra a situação não é fácil para o Nordeste.

A maior parte do subterrâneo do semiárido brasileiro está sobre o Escudo Oriental, onde predominam rochas cristalinas como ganisses, xistos, migmatitos, granitos e quartzitos. Na rocha cristalina, os aquíferos ficam restritos às zonas fraturadas . O Escudo Oriental se estende desde o Ceará, até o litoral de Santa Catarina, sendo que a maior parte está presente nas regiões Nordeste e Sudeste. Na parte Sudeste, as condições climáticas propiciam um manto de alteração que pode atingir várias dezenas de metros de espessura, favorecendo melhores condições hídricas subterrâneas, com vazões médias de poços de 10,0m /h, já na parte Nordeste as vazões médias não passam de 0,13m /h. É possível afirmar que o cristalino chega a cobrir praticamente 70% da área do semiárido nordestino, o que significa dizer que a região mais necessitada tem pouco disponibilidade de água tanto na superfície quanto embaixo dela.

A Revista NORDESTE entrou em contato com a professora Iara Brandão de Oliveira, da UFBA, que falou um pouco sobre as dificuldades de obter água em aquíferos do Cristalino. “Quando se perfura nessa região, se utiliza muita fotografia aérea para ver onde tem água subterrânea, porque onde tem água subterrânea, as plantas aprofundam suas raízes e fica verdinho, então você, sobrevoando, vê aquele verde e aí da para saber que ali, se não tiver um rio, tem que ter água no subsolo. Então o aquífero cristalino ele jamais é explorado onde tem rocha sã. Ele é explorado onde tem rocha fraturada, exatamente onde as plantas estão lá crescendo e extraindo água, então eles tem uma preferência de exploração ao longo dessa região de falha, que é onde a rocha foi mais ou menos triturada pelos movimentos tectônicos das rochas. Ali, o movimento das rochas tectônicas criam fraturas e é onde a água se acumula”.

Em uma região seca como o semiárido é preciso fazer bom uso da água da chuva e não desperdiçar uma gota. A professora explicou que boa parte da água da chuva não é absorvida pelo solo e evapora muito rápido. “A água da chuva só vai para o subsolo se for região de fraturamento. Se tiver rocha sã, não deixa a água entrar. Além disso os solos são muito rasos, como chove menos, o manto que a gente chama de solo, é raso. Assim, como chove pouco, o solo fica duro quando seco, e quando a chuva bate, aquele solo está muito duro e demora a permitir a penetração da água, então boa parte da água evapora ou escoa superficialmente, caminha para a cota mais baixa formando aqueles rios temporários e aí vai tudo embora”.

Para evitar esse tipo de desperdício, existem formas de direcionar o fluxo e criar barragens para armazenar essa água. “No Rio Grande do Norte tem muito aproveitamento de água em regiões… nas calhas dos rios, onde você tem areia, sedimentos. Então eles fazem um corte perpendicular à direção do fluxo, fazem uma cava e cobrem com argila ou com uma manta plástica e então preenchem com areia. Assim eles fazem o que se chama de barragem subterrânea, fazem um barramento dentro do próprio solo, criam uma maneira de colocar no subsolo um impedimento ao fluxo da água. Então quando chove torrencialmente no verão, que encharca o solo, aquele solo que está acima do barramento, fica com bastante umidade no subsolo e aí eles plantam, tem plantação perene de fruticultura, mangueira, umbuzeiro, mamão, e também algum tipo de semente que é mais temporário, feijão, milho, etc.”, exemplificou.

Principais aquíferos do Nordeste

Província Costeira

A província costeira é dividida em três bacias sedimentares. A Potiguar-Recife, a Alagoas-Sergipe e a Jatobá-Tucano-Recôncavo, na Bahia. Na bacia potiguar-recife encontram-se os sistemas aquíferos Dunas e Barreiras, que são utilizados para abastecimento humano nos Estados do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte. O Aquífero Açu, que é intensamente explorado para atender ao abastecimento público, industrial e em projetos de irrigação (fruticultura), na região de Mossoró (RN). E o Aquífero Beberibe, que é explorado na Região Metropolitana do Recife, por meio de 2.000 poços que atendem condomínios residenciais, hospitais e escolas.
Na bacia Alagoas-Sergipe encontra-se também o aquífero barreiras, que faz parte de um sistema que se estende por todo o litoral do Nordeste. Já a bacia Jatobá-Tucano-Recôncavo, como indica o nome, é a junção de três grandes bacias. A parte do recôncavo é onde está o polo petroquímico da Bahia. A bacia tem 1 mil metros de profundidade de aquífero saturado de água potável. Mas ao norte tem a bacia de Tucano, que tem grande potencial hídrico no norte da Bahia. Já mais perto de Alagoas é a bacia de Jatobá.

Província Parnaíba

O Paranaíba é a terceira maior província aquífera do Brasil e a maior do Nordeste, com 17.500 km³ de água, o que corresponde a mais de 15 de volume total de água subterrânea do país. Os principais aquíferos da província, entre eles Cabeças, Serra Grande e Poti-Piauí, abastecem os estados do Maranhão e do Piauí.  

Província Escudo Oriental

Conhecido também como cristalino, o Escudo Oriental é praticamente todo de rocha sã e o acesso à água é muito restrito. A capacidade dessas rochas de acumularem água está relacionada à quantidade de fraturas, suas aberturas e intercomunicação, permitindo a infiltração e fluxo da água. Poços perfurados nessas rochas fornecem poucos metros cúbicos de água por hora.

Província São Francisco

Na região Além São Francisco, o aquífero Urucuia tem grande capacidade hídrica. É bastante explorado para irrigação na agricultura da região, que tem plantação de soja e café.
 

Poços contaminados com Urânio

No passado o Greenpeace chegou a denunciar que havia contaminação de urânio nas águas do aquífero de Caitité, na Bahia. A ong afirmou que realizou muitas pesquisas e que o nível de radiação nas águas estava sete vezes acima do permitido pela Organização Mundial de Saúde. Após a denúncia, a própria Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia realizou testes e verificou que, de sete poços analisados, um apresentou contaminação de urânio em limite acima do permitido pela resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente.

A professora Iara Brandão afirmou que não é comum medir níveis de Urânio nas águas. “Na região de Caitité, o urânio é natural da rocha, então você espera que estará naturalmente dissolvido. Não é um urânio antrópico (o que é resultado da ação do homem). De qualquer maneira, a gente mede cálcio, magnésio, sódio, potássio, carbonato, bicarbonato, mas não se mede urânio. Além disso, não se tem histórico de ter urânio em todo o estado da Bahia, apenas em Caitité, onde é natural, assim como em Minas Gerais pode ter muito ferro na água”, explicou.
 


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