BRASIL

Sem apoio até entre aliados, governo deve engavetar projeto antimanifestação

O projeto de lei para “regulamentar as manifestações”, anunciado em fevereiro pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ainda não foi formatado no Ministério da Justiça e não há previsão de que chegará ao Congresso antes das eleições.

Pedido pela presidente Dilma Rousseff, em caráter de urgência e anunciado por Cardozo em meio a comoção pública devido à morte do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Andrade, a pasta optou por ouvir movimentos sociais, partidos políticos, juristas e pessoas ligadas à defesa de Direitos Humanos, antes de concluir a proposta.

A avaliação obtida pelo governo foi de que a proposta é desnecessária e, mais que isso, tem um enorme potencial para criminalizar movimentos populares.

A morte do cinegrafista foi causada pela explosão de um rojão, que o atingiu enquanto ele documentava uma manifestação no Rio de Janeiro. A comoção que se seguiu provocou a resposta do governo, que anunciou o pacote.

O Planalto trata o projeto como um instrumento para “conter violência em manifestações”. De acordo com o Planalto, esta proposta de legislação está em “fase de diálogo com representantes da sociedade civil e especialistas na área do Direito no Ministério da Justiça”. “A finalidade é receber contribuições e aprimorar o texto antes do envio ao Congresso Nacional”, respondeu a assessoria de imprensa do Planalto.

Nos bastidores, no entanto, membros do governo já admitem que a proposta não vai prosperar. A ordem é protelar ao máximo e não mandar para o Congresso Nacional um projeto que invariavelmente remete a repressão e intolerância com manifestações populares.

Na Câmara, entre deputados da base, a sensação é de que a melhor solução é de que a proposta nem seja concluída para ser votada. “Todo mundo se mobilizou para dar uma resposta a uma tragédia como aquela, mas o bom senso nos mostra que o melhor é que a proposta nem seja feita porque o resultado será a criminalização dos movimentos sociais”, disse a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Em resposta à consulta feita pelo Ministério da Justiça, o PCdoB elaborou um levantamento de todos os possíveis crimes decorrentes de manifestações. O resultado do estudo demonstrou que todos os crimes possuem tratamento previsto no Código Penal brasileiro ou mesmo na Constituição Federal. “Até a questão do anonimato é vedada pela Constituição”, exemplificou.

Para os próprios petistas, a proposta já tem sua “morte anunciada”. “Já existe legislação capaz de coibir crimes que ocorrem durante as manifestações. Não há necessidade de um projeto destes. Sou contra. Temos que votar uma legislação específica para o crime de terrorismo, nada mais”, disse o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP).

Ex-ministro de Direitos Humanos do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o deputado Nilmário Miranda (PT-MG) disse que vê com reservas qualquer iniciativa para criação de novas leis para reprimir manifestações.

“O que precisa é treinar a polícia. Acho muito perigoso esse negócio de criar leis repressivas”, analisou o deputado que também se disse preocupado com “crescente criminalização dos movimentos sociais no Brasil”. “Estou horrorizado como a polícia tem agido. Polícia não é para fazer revanche porque foi atacada. Tem que ser treinada para atuar em manifestações com armas que tenham o menor poder de lesão possível”, disse o deputado.

Para Nilmário, o governo não pode contribuir para o que chamou de “onda repressiva”. “Não quero criticar por criticar. Quero debater isso porque tem cada coisa acontecendo no Brasil nesse processo de criminalização de movimentos sociais que tem me deixado surpreso. Há uma onda de se fazer leis repressivas”, argumentou.


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