BRASIL

Aulas online obrigam milhões de alunos a usar app de empresa desconhecida que criou TV Bolsonaro

Uma empresa com sede numa sobreloja sem identificação na Região dos Lagos do Rio de Janeiro é a responsável por aplicativos usados por 7,7 milhões de alunos e professores de São Paulo, Paraná, Amazonas, Pará e Piauí para aulas à distância. A empresa, desconhecida mesmo no meio em que atua, é ligada a políticos bolsonaristas e a um acusado de participar de uma rede de prostituição de menores de idade.

Contratados a toque de caixa por conta da pandemia, os aplicativos têm problemas: apresentam defeitos de transmissão de som e imagem e não funcionam em celulares mais antigos. Mais grave, entregam à IP.TV, a empresa que os desenvolveu, uma série de dados pessoais de estudantes menores de idade e seus professores. E, em um dos apps, os alunos são expostos diretamente a mentiras e teorias da conspiração bolsonaristas.

A empresa, que em três meses saiu da obscuridade para se tornar a principal fornecedora de tecnologia para aulas à distância da rede estadual do país, entrou no negócio por acaso.

Até a pandemia, que tornou o ensino à distância fundamental, a IP.TV tinha em seu currículo um único produto de sucesso. Trata-se do Mano, um aplicativo de streaming de vídeos criado em 2018 para que a campanha de Jair Bolsonaro a presidente pudesse driblar os vetos de redes sociais a notícias falsas. À época, o garoto-propaganda do Mano foi Flávio Bolsonaro, atualmente senador pelo Republicanos do Rio de Janeiro e enrolado em investigações que o colocam como parceiro de milicianos.

O principal canal do Mano é justamente a TV Bolsonaro, criada para espalhar as mentiras e teorias da conspiração que alimentam a fanática claque do presidente de extrema direita. Quem frequenta o canal encontra um cardápio ininterrupto de programas com discursos, propagandas do governo e depoimentos de usuários que reproduzem notícias falsas e fazem apologia ao uso de armas e à ditadura militar.

A TV Bolsonaro está no menu oferecido a estudantes de Amazonas, Pará e Piauí que têm entre quatro e 17 anos de idade, ao lado de vídeos das aulas da rede de ensino público. Para terem acesso ao conteúdo didático, eles precisam baixar e usar aplicativo da IP.TV, em que são bombardeados pelos conteúdos bolsonaristas.

Já para os alunos de São Paulo e Paraná (nesse caso, como uma opção ao Mano), a IP.TV desenvolveu aplicativos específicos para exibir conteúdos didáticos. Em ambos, os estudantes ao menos estão livres de ver a TV Bolsonaro como sugestão de conteúdo.

Os governos dizem ter conhecido a IP.TV a partir de recomendações um do outro. Em São Paulo, o governo afirma que a IP.TV doou o app, chamado Centro de Mídias SP. A empresa o autoavaliou em R$ 3 milhões. Um valor obviamente exagerado, segundo três programadores a quem pedimos avaliações do sistema.


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