BRASIL

“Elite brasileira não se conforma com a ascensão da classe mais pobre”

Por Luan Matias

Santanna é um dos mais autênticos e conhecidos nomes da música nordestina. Influenciado diretamente por Luiz Gonzaga, de quem era amigo e músico dos seus shows, é um dos primeiros citados em qualquer lista de representantes do autêntico forró pé-de-serra. Atualmente se divide entre a divulgação do seu último disco e a apresentação de um programa em uma TV local de João Pessoa. Em entrevista concedida à Revista NORDESTE, o músico falou sobre sua infância, a sua relação com o Rei do Baião, política e cultura regional: “sou um estrangeiro no meu próprio país”.

Revista NORDESTE: Você é natural de Juazeiro do Norte. Como foi sua infância no sertão?
Santanna:
A minha infância foi uma infância de um menino pobre, do interior do sertão, que esculpia no tijolo de barro carrinhos de brinquedo. Uma criança que chorava sentindo saudades do Recife – PE, sem nunca ter ido lá e sem saber nem para que lado ficava tal cidade. Que esperava ansiosamente o carnaval para ouvir os frevos decantados pelo fantástico Claudionor Germano, nas emissoras de rádio da minha Juazeiro do Norte. Que quando ouvia Luiz Gonzaga, imaginava que a voz do meu pai, Seu Otávio, que me deixou muito pequeno quando se separou de minha mãe, Dona Zefinha, seria similar a voz do Rei. Sempre tive grandes sonhos. Sempre desconfiei que teria que dar uma contribuição para melhorar a vida das pessoas, através da minha vocação.


NORDESTE: Em que momento a música passou a fazer parte da sua vida? Quando ela se tornou uma carreira profissional?
Santanna:
Desde que eu nasci a música faz parte da minha vida. Tornei-me cantor profissional em 1992.

NORDESTE: Sobre a sua relação com Luiz Gonzaga, qual a importância dele para sua vida e carreira?
Santanna
: Em 1984, conheci Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, de quem me tornei amigo particular. A admiração pelo rei transformou-se em grande amizade. Participei de vários shows seus, fazendo a abertura e, em seguida, fazendo vocal.
Além de tudo o que já se sabe da vida dele, foi um grande empreendedor. Transformou uma pequena festa nordestina de quatro dias na maior festa brasileira, que já chega a durar 40 dias, como por exemplo (as festas juninas de) Campina Grande-PB e Caruaru-PE . Do ofício por ele inventado sobrevivem hoje inúmeras famílias no Brasil e no exterior. Ele foi verdadeiramente um gênio.Coube a mim seguir seus passos para fundamentar minha carreira artística e minha proposta musical.

NORDESTE: É possível viver exclusivamente da música cantando o autêntico forró? Como é o apoio da mídia? Acha que a cultura nordestina é subvalorizada nacionalmente?
Santanna:
Eu vivo disso. É muito pouco o apoio da mídia no que se refere à cultura popular. O Nordeste como um todo é excluído do dito Brasil. É como se não existisse. O Brasil pelo que vejo se restringe somente ao eixo sudestino (Rio, São Paulo e Minas Gerais). Por isso, antes de ser brasileiro, eu sou nordestino. Sou um estrangeiro no meu próprio país.

NORDESTE: Quais as principais dificuldades em tocar um estilo predominantemente regional? Você acredita que hoje há mais ou menos espaço para o forró pé de serra, se comparado com algumas décadas atrás? Há renovação ou o estilo sobrevive dos mesmos nomes?
Santanna
: Na minha humilde opinião, creio que quanto mais regional, mais universal, como dizia João Cabral de Melo Neto. O blues é um estilo regional de New Orleans que pela divulgação se tornou universal. Portanto, não enxergo dificuldades em executar a música de raiz da minha Nação Nordestina. Com a irreversibilidade das redes sociais hoje existe mais possibilidade de espaço para divulgação da nossa música do que há dez anos. Há renovação sim. Tem muita gente competente fazendo o forró de verdade.

NORDESTE: Como você, com sua visão de artista, enxerga o atual momento político do Brasil?
Santanna
: Vejo que, como antigamente, a elite brasileira não se conforma com a ascensão da classe mais pobre. Faço minhas as palavras do grande Darcy Ribeiro: "Ultimamente a coisa se tornou mais complexa porque as instituições tradicionais estão perdendo todo o seu poder de controle e de doutrina. A escola não ensina, a igreja não catequiza, os partidos não politizam. O que opera é um monstruoso sistema de comunicação de massa, impondo padrões de consumo inatingíveis e desejos inalcançáveis, aprofundando mais a marginalidade dessas populações".

NORDESTE: Quais projetos estão em andamento na sua carreira? Tem feito muitos shows pela região?
Santanna
: Os projetos são o novo CD intitulado O FORRÓ NOSSO DE CADA POESIA e a condução do Programa Sala de Reboco na TV Tambaú, em João Pessoa-PB, no qual sou o apresentador. Tenho trabalhado bastante no Nordeste, com a graça de Deus.

NORDESTE: Em relação ao futuro, quais são os seus planos? Onde se enxerga daqui a alguns anos?
Santanna:
Pretendo levar adiante o meu projeto de vida artística com fidelidade, conspirando para que as consequências do meu presente sejam totalmente benéficas e que deste jeito eu possa dar a minha contribuição para a melhoria do nosso planeta. 


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