BRASIL

Jaques Wagner diz que solução está na Reforma Politica

Entre a manifestação de sexta-feira, que foi pacífica e explicitou uma larga base de apoio à presidente Dilma, e a de domingo, que ainda não tinha acontecido, protestando contra o governo e até pregando o impeachment, o ministro da Defesa, Jacques Wagner, conclamou a sociedade e a classe política a canalizar a energia das ruas para um enfrentamento objetivo de problemas como a corrupção e o déficit de representatividade. Em entrevista ao 247 ele diz que a resposta urgente e objetiva deve ser a aprovação da reforma política. Abaixo os principais pontos da entrevista:

Depois das manifestações

“Nesta sexta-feira houve grandes manifestações, pacíficas e ordeiras, em quase todo o país, em defesa da Petrobrás, da democracia e da ordem constitucional e dos direitos trabalhistas. No domingo teremos manifestações, cuja grandeza ainda não pode ser avaliada, convocadas com um tom fortemente crítico ao governo. Esperamos que transcorram também dentro da normalidade e da ordem, com respeito à diferença de opiniões. Este espetáculo de democracia deve nos orgulhar. Todos nós, democratas, só podemos nos alegrar com estes 30 anos ininterruptos de democracia, de absoluta liberdade de expressão e manifestação, com todas as instituições funcionando. Agora, passadas as manifestações, esta energia política das ruas deve ser canalizada para um enfrentamento objetivo de nossos principais problemas, como a corrupção e seu enraizamento cultural e o déficit de representatividade. E a primeira resposta a ser dada, tanto pela sociedade como pela classe política, a meu ver deve ser um pacto para aprovar a reforma política, pois tal como está, este sistema não pode continuar. Precisa mudar para que nossa democracia ganhe mais efetividade. A sociedade precisa entender a íntima relação que existe entre a corrupção e este sistema, especialmente entre corrupção e o financiamento privado de campanhas, que está na origem de praticamente todos os escândalos das últimas décadas.

A hora da reforma

Perguntado se existe ambiente político no Congresso para discutir e votar uma reforma política agora, com a oposição radicalizada, a base governista com baixa coesão e 50 parlamentares sob investigação do STF, o ministro diz que a reforma política deve ser encarada como uma necessidade do país, não como proposta do governo ou deste ou aquele partido. “O grito da sociedade contra a corrupção está sendo ouvido mas só será efetivo se tivermos coragem de enfrentar a reforma política, com apoio da sociedade, da imprensa, das instituições civis organizadas, o que lhe dará mais legitimidade. Ao mesmo tempo, é preciso combater a cultura da corrupção, que vai se enraizando entre nós. Ao governo cabe agir, garantindo autonomia a instituições como a CGU, o Ministério Público e a Polícia Federal. Esta independência, nos governos do PT, é que têm permitido a revelação de falcatruas e ilícitos que, em outras condições, ficariam impunes. A sociedade, de seu lado, deve manter-se atenta contra a corrupção e contribuir com o combate ao seu enraizamento em nossa cultura, que começa pelos pequenos gestos de cada um, do suborno ao guarda de trânsito para não levar multa aos subterfúgios para escapar do imposto de renda. Ao Congresso cabe entender que chegou a hora improrrogável da reforma política, antes que a corrupção e as disfuncionalidades do sistema afetem a própria confiança na democracia. Acredito que todos os partidos, no Congresso, têm esta compreensão”.

A reforma política possível

A reforma possível no momento, para Jacques Wagner, não deve ser pretensiosa. Deve concentrar-se nos aspectos que produzem mais distorções e problemas para a vida democrática. “A meu ver deveríamos aprovar agora uma reforma mínima mas certeira, atacando três pontos cruciais, que são:

* Acabar com o comércio do tempo de televisão, origem da grande dispersão do quadro partidário. Neste quadro, todo e qualquer governo terá que compor uma vasta coalizão para conseguir governar, com tudo que isso acarreta.

* Acabar com a coligação na eleição proporcional, vale dizer, a de vereadores, deputados estaduais e federais. Esta anomalia só existe aqui, e sua principal consequência é a baixa representatividade dos eleitos. Com esta regra, basta um a um partido ingressar numa coalizão com um outro maior para eleger representantes. O resultado são partidos sem lastro na sociedade e a eleição de parlamentares que, fora da coligação ou sem a ajuda das sobras de um grande puxador de votos, jamais conquistariam um mandato.

* Acabar com o financiamento privado de campanhas e adotar o financiamento público. A sociedade entenderá que o Estado não estará gastando mais com a política, mas economizando recursos que sairiam pela outra porta, a da corrupção decorrente das relações promíscuas entre agentes políticos e financiadores privados. O financiamento público fechará esta porta e poupará a democracia brasileira de ser frequentemente açoitada pelos escândalos de corrupção que, segundo a própria Polícia Federal, em sua grande maioria têm relação com o financiamento de campanhas e partidos. Veja que a distribuição dos recursos legalmente doados pelas grandes empreiteiras aos três maiores partidos, PT, PMDB e PSDB, foram bastante equilibradas. Segundo dados do TSE, que vocês publicaram, em 2010 a proporção foi de 24% para o PMDB, 23% para o PT e 20% para o PDB. Em 2014, foi de 25% para o PT, 24% para o PSDB e 21% para o PMDB. O empresário apostam em ter boas relações com todas as forças políticas, que estarão no governo federal, governos estaduais ou no Congresso. Aqui não existe o alinhamento de empresas com este ou aquele partido, como em outros países. Eles não vestem nenhuma camisa, tratam de estar bem com todos. Com o financiamento público de campanhas, este relacionamento íntimo entre os doadores e os partidos acaba.

Acordos necessários

Lembrado de que a proposta contemplada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para ser votada, mantém o financiamento privado, embora com limites para doações e regras para as doações de pessoas físicas, Wagner admite que algum acordo será necessário. “O presidente da Câmara tem autoridade para comandar o processo legislativo mas este tema será debatido, tanto na sociedade como dentro do Congresso. Como tudo na democracia, terá que ser objeto de um acordo. Este pacto, que é urgente, deve perseguir o maior avanço possível no financiamento de campanhas. Para mim, seria com a aprovação do financiamento exclusivamente público. Vamos ver. O importante é acelerarmos o processo. Como disse no início, é hora de dar consequência à energia dos que foram às ruas.

Impeachment

“Em momentos de dificuldades econômicas surgem grupos radicalizados e mesmos agentes da elite política tentando se aproveitar para montar palanque. Aliás, a oposição ainda não desmontou seus palanques da campanha passada. Opinião todos podem manifestar mas a legitimidade das manifestações não é maior do que a dos que foram eleitos, seja para vereador, deputado, governador, senador e presidente da República. Na classe política, todos sabem que não existem condições jurídicas para um pedido de impeachment, que seria naturalmente arquivado. O ministro do STF Gilmar Mendes, insuspeito de alinhamento com o governo, acaba de dizer que não existem bases para um impeachment. Insistir nisso seria apostar numa ruptura que, tenho certeza, o Brasil democrático não aceitaria. Então, precisamos ter mais zelo para com esta flor delicada chamada democracia“

O ajuste fiscal e a comunicação

O ministro reconhece que a insatisfação externada não foi só com a corrupção e com os políticos, mas também com as medidas do ajuste fiscal, criticadas pela manifestação de sexta-feira, puxada principalmente pela CUT e o MST, do campo da esquerda. “Talvez não tenhamos conseguido explicar melhor o ajuste fiscal, que não é um fim, mas um meio para continuarmos mantendo e ampliando as conquistas destes 12 anos de governos com foco no social, no combate à pobreza e à desigualdade, no crescimento da economia e no fortalecimento internacional do Brasil. O ajuste é um tempo de vacas magras para que possamos voltar ao tempo das vacas gordas, com mais crescimento, renda e emprego para todos. Dificuldades econômicas minam a esperança, que conforta a alma, e trazem incertezas sobre o futuro. Se as dificuldades começarem a ser compreendidas como uma necessidade, não como uma escolha ou uma maldade, será mais fácil superá-las e mais rapidamente conseguiremos fazer isso.”


 


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