BRASIL

Manifestação em repúdio à violência obstétrica acontece sábado

Neste sábado (12), às 15h30, no Busto de Tamandaré, em João Pessoa, grupos de ativistas relacionados à saúde da mulher e aos direitos sexuais e reprodutivos femininos realizam um ato de apoio a Adelir Góes, que foi forçada e coagida pela Justiça da cidade de Torres (Rio Grande do Sul) a ser submetida a uma cirurgia cesariana. A manifestação acompanha uma movimentação nacional que pretende, através do caso de Adelir, exigir dos Ministérios Públicos atuação e investigação de casos de violência obstétrica, cada vez mais comuns no Brasil. As manifestações ocorrem em cadeia, em mais de 100 cidades do país, e em grandes centros como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, a partir do dia 11 (sexta-feira).

“Queremos deixar claro que a decisão sobre a forma de nascimento não deveria ter sido tirada do poder da gestante, uma vez que se trata de um direito assegurado pela Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. Não se trata apenas de via de nascimento, parto normal ou cesárea, pois, ainda que a mãe tivesse optado por uma cesariana e o médico fosse contra a decisão, mostrando os riscos, ela deveria ter sido respeitada. Essa atitude abre precedentes para que, daqui por diante, qualquer profissional interfira judicialmente na decisão da mulher, prejudicando o seu protagonismo”, afirma Érica Chianca, uma das organizadoras da manifestação da capital. A autonomia pelo próprio corpo é garantida por lei, está inclusive descrita no Manual do Usuário do Sistema Único de Saúde. A conduta da equipe médica, ao denunciar Adelir, fere ainda os princípios da Bioética Médica.

Durante a manifestação pacífica, que terá a participação de profissionais da saúde, doulas, gestantes, mulheres, mães, pais e crianças, serão distribuídos panfletos educativos ao público da praia. O movimento deve passar informações sobre os direitos da mulher, assim como desmistificar o conceito de que a cesárea eletiva foi a melhor opção para a gestante do caso Torres (RS), ofertando material que expõe os mais novos conceitos da medicina baseada em evidências sobre mitos e verdades sobre o parto normal.

A manifestação conta com o apoio do Cunhã Coletivo Feminista aqui no estado, e nacionalmente com a Artemis, aceleradora social que trabalha pela autonomia da mulher e seu direito de escolha, com especial atenção à prevenção e erradicação da violência obstétrica. A organização já entrou com uma denúncia junto a várias instituições, como Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Presidência da República, Disque Denúncia de Direitos Humanos, Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República.

O caso também já começa a receber atenção do Congresso Nacional. O deputado federal Jean Wyllys divulgou uma nota informando que vai solicitar, em caráter de urgência, uma audiência pública para discutir estes casos, cobrando do Poder Executivo, através do Ministério da Saúde e da Secretaria de Políticas para Mulheres, posicionamentos e soluções para a questão.

Sobre o caso Adelir

Segundo Adelir, que já havia sido induzida a outras duas outras cesáreas com os filhos mais velhos, era importante que dessa vez ela se sentisse participante ativa do próprio parto. Ela conta que já estava com nove centímetros de dilatação e com contrações ritmadas de cinco em cinco minutos, quando chegaram à sua casa um oficial de justiça e duas viaturas policiais e a levaram, sob ameaça de prisão, ao Hospital Nossa Senhora dos Navegantes.

Na tarde do dia 31 de março de 2014, Adelir havia procurado o hospital por já estar sentindo algumas dores. Na ocasião, a médica ordenou que ela se internasse para uma cirurgia cesariana imediatamente. No entanto, Adelir assinou um termo de responsabilidade e voltou para casa com o objetivo de esperar o trabalho de parto, já que o monitoramento fetal apresentou bons resultados no quadro clínico da mãe e do bebê. Além disso, ela havia feito todo o pré-natal (total de nove consultas) e realizado todos os exames requisitados. Todos apresentavam normalidade e a gestação não era de risco.

Inconformada com a escolha da gestante, a médica decidiu acionar a Justiça, alegando risco iminente de morte. As justificativas que apontavam urgência, no entanto, estão sendo questionadas por boa parte da comunidade médica do país. Segundo estudos clínicos atualizados e em acordo com as evidências científicas, os motivos alegados: duas cesarianas prévias, bebê em posição podálica (uma variação da pélvica – sentada) e idade gestacional estimada em 42 semanas; não são indicações de cirurgia imediata, a menos que mãe ou bebê estivessem apresentando algum sinal de sofrimento, o que não foi diagnosticado pelos exames realizados pela própria instituição. Além disso, o exame, divulgado após o grave incidente, atestou também que a idade gestacional era, na verdade, de 40 semanas e não de 42. Fato que corrobora ainda mais para a falta de caráter urgente da cirurgia indicada pela médica.

Adelir passou pela cirurgia e a filha nasceu bem, com apgar alto (o apgar é um exame que avalia o estado do recém-nascido) – o que mostra que não estava em sofrimento. Durante a cesariana, a parturiente também não teve assegurado seu direito ao acompanhante. O marido foi impedido de acompanhar o procedimento. A lei do acompanhante vem sendo desrespeitada em várias maternidades brasileiras, apesar de existir desde 2005.  


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