BRASIL

Matéria especial traz analistas e líderes apontando saídas para 2016

Por Paulo Dantas

O ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, esteve em São Paulo em novembro e afirmou que o país não estava afundando, pelo contrário, o futuro era formidável. A declaração foi como um solavanco no complexo de vira-lata dos brasileiros. A teoria (do complexo) foi advogada pelo dramaturgo Nelson Rodrigues quando o Brasil perdeu a Copa do Mundo em pleno Maracanã, em 1950, para o Uruguai. Mas continua bastante atual.


O Brasil vive hoje um turbilhão político e econômico onde uma espécie de Tea Party brasileiro (movimento de ultra direita norte-americano) tem ido às ruas pedir entre outras coisas o retorno da ditadura. A crise é ética, na mídia e nos valores, mas também se reflete numa espécie de desesperança geral. “Queremos que o ano de 2015 termine, mas não queremos que o ano de 2016 comece”. A frase é do presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade e dá o tom da angústia reinante. A visão do presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, também tem um tom sombrio: “Esse ano foi um ano muito difícil para todos e este momento requer cautela absoluta. É como uma estrada, quando o tempo fecha e há muita neblina”.


Apesar disso, Clinton, que deu palestra no encerramento do Encontro Nacional da Indústria, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que "prefereria estar na posição do Brasil do que na de muitos outros países. Os desafios políticos são uma chance para, daqui a 5 anos, vocês olharem para trás e pensarem: com o que estávamos nos preocupando?", afirmou. "O navio do Brasil não está afundando", completou. Clinton ainda lembrou as transformações econômicas e sociais ocorridas no Brasil nos últimos 25 anos e disse que o país não perdeu o potencial de continuar avançando. "A capacidade do Brasil de fazer as coisas acontecerem é incrível", ressaltou. O ex-presidente abordou ainda o sistema político brasileiro. Para ele, a crise de hoje renderá avanços no futuro. "Vocês estão no meio de um esforço de tornar o seu sistema político transparente. Isso será bom daqui a alguns anos", disse.


Para entender esse painel ao mesmo tempo desanimador, mas também cheio de desafios, a Revista NORDESTE procurou saber como foi o ano de 2015 e quais as reais projeções para 2016, um ano que já nascerá com o Congresso Nacional dando seguimento ao pedido de cassação de Eduardo Cunha (PMDB), e um pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). A questão proposta, junto a especialistas, além de representantes de entidades de classe empresarial, foi como chegar a superação do atual momento. Além de quais lições deixa a crise política e econômica de 2015.  

Lições que não devem ser esquecidas

Talvez a maior lição do ano, seja como um Congresso adverso pode levar uma crise econômica para uma situação insustentável. Impedir reformas necessárias e, ao invés de tentar acalmar o mercado, buscar o efeito contrário, acirrando ânimos e implodindo nervos. É bom lembrar que 2015 já seria um ano difícil pelos ajustes que precisavam ser feitos, por si só, mas a crise política fez questão de dinamitar o terreno.


A Confederação Nacional da Indústria (CNI) avalia que a instabilidade política continuará e adiará as medidas necessárias para a recuperação da confiança dos agentes econômicos. “Os eventos políticos recentes, que culminaram na abertura do processo de impedimento da presidente da República, adicionam grau de complexidade ainda maior ao momento. Esse cenário conturbado marcará os primeiros meses de 2016, indicando que a travessia em direção à recuperação econômica deverá ser mais difícil”, frisa o Infome Conjultural – Economia Brasileira, divulgado em dezembro.


O professor Rômulo Polari, economista e ex-reitor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) explica o delicado momento econômico de 2015. Para ele a crise encontrou a economia brasileira, nos primeiros meses do ano, com pesados desequilíbrios e altas taxas de juro, inflação e déficit público. “Era o auge da exaustão do modelo econômico apoiado numa forte atuação do governo. Inviabilizaram-se as políticas de recuperação com base nos gastos e investimentos públicos. A opção pelo ajuste fiscal ortodoxo complicou a situação”, pontua Polari, para quem o ajuste foi um fiasco ao tentar corte de despesas, sem a aprovação do Congresso, e vislumbrar queda de receitas.


“Isso aumentou o déficit fiscal, a inflação e a taxa de juro. Os investimentos e consumo privados caíram, amplificando os efeitos recessivos da queda das despesas governamentais. Nesse contexto, com taxa básica de juro de 12% a 14% ao ano, a expansão dos gastos e investimentos do governo aumentaria o endividamento e déficit públicos a níveis explosivos. Essa política não geraria recuperação e sim instabilidade, inflação, aumento da taxa de juro, recessão e desordem fiscal. Esse quadro de limitação do governo brasileiro elevou o grau de dificuldade das ações anticrise”, avalia o economista.


Para corroborar a visão desenhada por Polari, basta verificar o Informe do CNI, que o Brasil continuará encolhendo no ano que vem. O Produto Interno Bruto (PIB) terá uma queda de 2,6%, puxado especialmente pela retração de 4,5% na indústria. O desemprego alcançará 11%, o consumo das famílias diminuirá 3,3% e os investimentos cairão 12,3%. "Pouco se avançou para a construção de um ajuste fiscal crível e permanente, aliado a mudanças estruturais capazes de impulsionar a recuperação da atividade econômica. Por isso, o cenário para 2016 não de diferente de 2015".


Outro fator complicador é que o ano fechará com a inflação de 10,5% e com demanda decrescente. Além disso, os principais componentes do PIB pelo lado da demanda (consumo das famílias) e pelo lado da oferta (serviços) estão diminuindo, o que não acontecia há mais de uma década. Outro fator preocupante é que os investimentos caíram pelo segundo ano consecutivo em magnitude superior a 10%. A previsão é que o PIB de 2015 caia 3,3%, o consumo das famílias encolherá 3,9% e o desemprego chegará a 8,3%.


2015 não foi um ano fácil, mas trouxe lições que não podem ser esquecidas, a maior delas é como um Congresso hostil pode implodir um país.

 

A força da exportação e das micro e pequenas empresas 

Como boas notícias para o ano que vem, além da exportação em alta, há o microempreendedorismo, ambos são setores em alta.
“A única alternativa que estamos vendo mais concreta são as exportações. E as exportações dependem de acordos internacionais que o Brasil felizmente está correndo atrás. Essa é uma agenda que a gente tem que reconhecer que, independente dos problemas políticos, o Brasil está avançando. Fez um acordo com o México, Colômbia, Chile, fez uma proposta para a União Europeia que vai ser discutida daqui para frente. Acho que a mudança política na Argentina vai facilitar essas discussões e entendimentos”, avalia o presidente do CNI, Robson Braga de Andrade.


O presidente do Serviço de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e ex-ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, Afif Domingos, lembra a máxima chinesa, para quem a crise também é uma oportunidade. “Sou empresário e sempre fui muito otimista. Vejo a crise como um momento de oportunidade, as pessoas são tiradas da zona de conforto e se tornam mais motivadas às mudanças. Não tenho dúvidas que são as reformas microeconômicas as possíveis de serem feitas nesse momento de crise”, argumenta.


O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, também defende uma postura mais propositiva. Ele ressalta que apesar da crise é preciso ir atrás das oportunidades. “Não podemos esquecer que quem dá a coragem para o investimento é a carteira de pedidos. Quando a empresa está com a carteira cheia, ela tem bastante coragem e confiança para investir em mão de obra, em equipamento e tecnologia. Quando as vendas estão despencando todo mundo fica receoso. No entanto, não podemos esquecer que há muito dinheiro no mundo que poderia ser investido no Brasil, já que para o investidor estrangeiro os ativos brasileiros ficaram bem baratos. Precisamos ter fé no nosso país. O Brasil é maior que a crise”, defende.


Em relação a balança comercial e ao dólar alto, Skaf lembra que durante um longo período no Brasil, o câmbio foi usado como mecanismo de controle da inflação. “O dólar baixo barateia artificialmente as importações e estimula as importações. Essa política desarticulou todas as cadeias produtivas nacionais e foi umas das causas do rápido processo de desindustrialização brasileiro. Sendo assim, a desvalorização do Real frente ao dólar traz um ganho para o produtor nacional frente ao produto importado, tanto no mercado interno quanto externo”, reclama. Apesar de entender que o câmbio teve importante parcela de culpa nas perdas sofridas pela indústria, o empresário acredita que as empresas brasileiras, em sua grande maioria, são modernas e bastante competitivas. “Principalmente pelo fato de que sobrevivem em um ambiente de negócios extremamente hostil como o brasileiro, que em nenhum outro lugar no mundo estariam expostas”.

Os pontos positivos do Brasil aos olhos do mercado 

“O Brasil realmente possui alguns pontos diferenciados em relação a outros países semelhantes. A despeito da elevada violência brasileira, nós não temos nenhum conflito interno grave. Além disso, nossas instituições são fortes e isentas e nossa imprensa é livre. Do ponto de vista econômico, possuímos recursos naturais abundantes, uma economia diversificada com um vasto mercado consumidor e empresas competitivas e modernas”, a afirmação é do presidente da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp, do Sesi e Senai/SP e Sebrae), Paulo Skaf.


Outro ponto de sucesso do país, apesar da crise que atravessa, é o desempenho das micro e pequenas empresas. Elas apresentaram bons resultados em 2015. Na arrecadação do Simples Nacional, entre janeiro e outubro, observou-se crescimento real de 5,2% em relação ao mesmo período do ano passado. Em relação à geração de emprego, os pequenos tem apresentado resultados muito melhores do que as grandes e médias empresas, tendo saldo positivo nas contratações até agosto e apresentando perdas menores em setembro e outubro de 2015. De janeiro a outubro, as Micro e Pequenas Empresas (MPEs) tiveram saldo positivo na geração líquida de empregos de quase 66 mil vagas contra saldo negativo de quase 900 mil vagas nas grandes e médias empresas.


“Conseguimos também a grande vitória de alcançarmos a marca de 5 milhões de Microempreendedores Individuais (MEIs), que é o novo empreendedor brasileiro. Pessoas que trabalham por conta própria passaram a ser formalizados e começaram a contar com direitos previdenciários, como auxílio maternidade e aposentadoria. O MEI é um programa de formalização e inclusão produtiva e previdenciária, criado em 2009, que atende a pequenos empreendedores de forma simplificada, descomplicada e com redução de carga tributária”, conta o presidente do Sebrae, Afif Domingos. O presidente que foi ex-ministro da Secretaria de Micro e Pequenas Empresas, lembra que o governo tem pressionado para que seja aprovado no Congresso o projeto Crescer Sem Medo (PLC 125/2015), que cria uma rampa suave de crescimento para as empresas permanecerem no Simples Nacional. “Assegurar melhores condições no ambiente de negócios brasileiros fortalece os pequenos negócios e é uma saída para enfrentar a crise”, argumenta.

A criatividade como porta de saída para a crise

Não é de hoje que a Economia Criativa é sinalizada como porta de saída para o desenvolvimento.
Contudo, em relação a soluções tradicionais para uma saída da crise, normalmente tidas como indigestas, está a correção de rota, quando o país mantém mudanças em andamento e aprofunda o ajuste permanente das contas públicas, avançando na agenda de reformas estruturais. "Nesse caso, após um período de ajuste expressivo, a economia gradualmente recompõe a confiança e eleva sua competitividade, sendo possível vislumbrar um novo ciclo de crescimento a partir de 2017", frisa o Informe Conjuntural do CNI, que continua, explicando que ajustes pontuais, ao invés de estruturais e profundos, apenas prologariam o momento de agonia pelo qual o país vem passando.

“Na avaliação da CNI, a economia só voltará a crescer se o país adotar uma agenda baseada em três eixos: medidas de estabilidade macroeconômica, ajuste fiscal de longo prazo e melhoria do ambiente de negócios e da segurança jurídica”, diz o Informe. Sem fugir dessa visão mais pragmática, há outras propostas. Afif Domingos lembra que diferentemente da economia tradicional, baseada principalmente na agricultura, indústria, comércio e serviços, a Economia Criativa tem foco especialmente na criatividade, na imaginação e na capacidade intelectual para o desenvolvimento de novos negócios. Ela promove a inclusão social e produtiva, uma vez que dinamiza a economia, gerando emprego e renda, além de promover a formação de novas profissões no mercado produtivo.

“Os profissionais ocupados nestas atividades geralmente têm formação técnica especializada e recebem remuneração de maior valor, o que impacta positivamente no conjunto da economia. As empresas podem ser de pequeno porte, com baixos custos iniciais de instalação, mas com capacidade de crescimento rápido e de criação de produtos com alto valor agregado. O setor da Economia Criativa é justamente aquele que pode reagir com maior velocidade em regiões como o Nordeste, pois tem mais flexibilidade para ajustar sua estrutura de custos e mais resiliência para se adaptar às novas condições do mercado”, informa. Ainda segundo Domingos, o Brasil tem potencial competitivo em vários segmentos da Economia Criativa. “Exportamos nossas produções de teledramaturgia para mais de 150 países. Nossa música é internacionalmente reconhecida e admirada. Nossa publicidade é premiada nos principais festivais internacionais. Nossa moda é original e singular. Além disso, também conquistamos notoriedade na gastronomia, nos games, nas startups de economia digital”.


Sobre qual seria o negócio bola da vez no atual momento de crise, Domingos aponta para o setor de serviços, que possuiria menos armadilhas do que outros. “Ele demanda menos investimento inicial, menos imobilização de capital: não tem de adquirir máquinas e equipamentos, como a indústria, nem exige composição de estoques iniciais, como o comércio. Agora, negócio promissor independe de área de atuação. É aquele que investe na capacitação, no conhecimento, que é a grande ferramenta para uma empresa inovar e se destacar em relação à concorrência”. 

Para conferir a matéria na íntegra, inclusive com entrevista de empresários e cientistas click aqui


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