MARANHÃO

Mistérios do imaginário popular e lendas que circulam em São Luís

A capital maranhense é palco de diversas lendas e histórias passadas de geração a geração. O historiador Diogo Galhardo explicou a origem de algumas dessas narrativas que povoam o imaginário popular.

 

Atenas Brasileira, Ilha do Amor ou Cidade dos Azulejos. São Luís possui muitos apelidos relacionados às suas belezas arquitetônicas e naturais, mas, para além desses aspectos, a cidade também é conhecida pelo seu rico folclore.

A capital maranhense é palco de diversas lendas e histórias passadas de geração em geração. Todo ludovicense já deve ter ouvido falar sobre a lenda da Ana Jansen, que vaga pelas ruas de São Luís em uma carruagem assombrada, ou sobre uma serpente encantada que afundará a cidade quando despertar.

Essas histórias fazem parte da memória de São Luís e constituem uma identidade cultural única. Para relembrar esse aspecto tão importante do folclore maranhense, reunimos algumas lendas e histórias do imaginário popular que circulam há anos em São Luís, trazendo curiosidades sobre a origem delas.

 

Sem dúvidas, a lenda mais famosa de São Luís é a da carruagem de Ana Jansen. De acordo com o mito, pelo seu passado de crueldades, a mulher foi condenada a passar a eternidade vagando pelas ruas da cidade em uma carruagem fantasmagórica.

O veículo, conduzido por um escravo ensanguentado e cavalos decapitados, sai do Cemitério do Gavião e percorre as ruas de São Luís nas noites de sexta-feira. Muito se ouve sobre a lenda, mas poucos sabem que Ana Jansen foi uma líder política muito respeitada no século XIX.

Ana Jansen, também conhecida como Donana, nasceu em 1787 na capital maranhense. Quando ainda era adolescente, foi expulsa de casa pelo pai após engravidar de um homem desconhecido, pois era considerada “desonrada” por não ser mais virgem e mãe solteira.

Depois de um período de muitas dificuldades, ela se tornou amante do coronel Isidoro Rodrigues Pereira, homem mais rico da província na época. Assim que a esposa do coronel morreu, Ana Jansen casou-se com ele e desempenhou um importante papel nos negócios da família.

Após 15 anos de relacionamento, Isidoro faleceu e, a partir dessa época, ela se tornou uma poderosa senhora de terras e detentora de escravos, chegando a ser conhecida como “Rainha do Maranhão”. De acordo com o historiador Diogo Galhardo, Ana Jansen também foi uma importante líder política do século XIX.

“Ana Jansen foi a chefe de fato do Partido Liberal no Maranhão imperial, entre as décadas de 1840 e 1860. Todas as candidaturas passavam ou não por sua aprovação. Por ser mulher, não podia ser ela própria a mandatária política, mas todas as articulações do partido estavam sob seu controle”, ressalta Diogo.

Por causa de sua “má fama”, essas histórias se enraizaram no imaginário popular local e, até hoje, a lenda da carruagem da Ana Jansen assusta muitos que a ouvem.

Lenda da serpente encantada

O Centro Histórico de São Luís é repleto de galerias subterrâneas construídas no final do século XVIII. De acordo com Diogo Galhardo, esses canais faziam parte de um complexo sistema de abastecimento de água para a cidade.

“Essas galerias são um engenhoso e complexo sistema de abastecimento de água para a capital, interligando poços e nascentes. Foi construído no final do século XVIII, e poucas cidades possuíam tal sistema à época”, afirma.

É nesse cenário que nasceu a antiga lenda da Serpente Encantada. Segundo o mito, vive nessas galerias uma gigantesca serpente encantada que cresce sem parar.

Conforme a lenda, a barriga do animal estaria na Fonte do Ribeirão, a cauda na igreja de São Pantaleão e a cabeça na Fonte do Ribeirão, importante ponto turístico da cidade. A serpente vem crescendo ao decorrer dos séculos e, quando a cabeça encontrar a cauda, o animal despertará e destruirá a Ilha de São Luís.

A lenda se tornou tão famosa que, em 2001, uma serpente confeccionada pelo artista plástico Jesus Santos foi colocada na Lagoa da Jansen. A escultura de 74 metros de comprimento pode ser vista de longe por quem passa pelo bairro Ponta D’Areia.

Lenda da Manguda

No final do século XIX, circulavam entre a população ludovicense vários relatos de pessoas que viram um fantasma na região onde hoje é a Praça Gonçalves Dias. A assombração, chamada de Manguda, era uma figura branca com uma luz que saía de seu corpo e cabeça.

No entanto, essa lenda foi desmentida quando os populares da época descobriram que as aparições eram, na verdade, bandidos contrabandistas fantasiados com lençóis. Eles utilizavam esse disfarce com o objetivo de assustar e afastar os curiosos enquanto realizavam suas ações criminosas.

Para o historiador Diogo Galhardo, mesmo após serem desmentidas, essa e outras lendas ainda vivem no imaginário popular, porque se tornaram parte integrante da identidade social local.

“As pessoas devotam certo crédito às lendas porque elas passaram a integrar a própria identidade social local. As lendas terminam sendo também marcadores de diferenciação, algo que é particular do ludovicense”, diz o historiador.

Lenda da praia do Olho D’água

Quase todo ludovicense já deve ter visitado a praia do Olho D’água, mas, o que muitos não sabem é que, de acordo com uma lenda, as águas da praia vieram das lágrimas de uma mulher de coração partido.

A lenda conta que há muito tempo, no local, havia uma aldeia indígena, onde a filha do cacique Itaporama e um jovem da tribo se apaixonaram. No entanto, a beleza do rapaz também conquistou o coração da mãe d’água.

Por meio dos seus poderes, a mãe d’água seduziu e levou o jovem para o seu palácio encantado no fundo do mar. Percebendo que havia perdido o seu grande amor, a filha de Itaporama ficou desolada, chorando até morrer.

Das lágrimas da jovem surgiram duas nascentes que até hoje deságuam para o mar. Por isso, o nome da praia também faz referência a antiga lenda.

Verdadeiras ou não, essas lendas fazem parte da identidade cultural de São Luís. Para Diogo, essas narrativas não permanecem apenas no passado imaginário, mas também se ligam a problemas reais como o racismo, violência e concentração de poder.

“As lendas ligam o presente ao passado, e tomam ares de mito identitário. A sociedade passa a se reconhecer através das lendas, evocando méritos e deméritos, que não estão apenas no passado imaginário, mas que dialogam com os problemas reais do presente, como o racismo, a violência, a concentração de poder”, diz o historiador.

 

Por Geisa de Almeida*, g1 MA — São Luís

g1ma

 

 

 


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