BRASIL

Para manter manifesto, ala do PSB tenta restringir debate a programa de Campos

Após a polêmica sobre a possível mudança no manifesto do PSB, documento de 1947 que rege o partido, os socialistas contrários à alteração já falam em restringir as “atualizações”, pelo menos neste ano eleitoral, ao programa de governo de seu pré-candidato à Presidência da República, Eduardo Campos. O fundador do partido e hoje, vice-presidente, Roberto Amaral (CE), amenizou as críticas a Campos, que defendeu nos últimos dias a alteração de trechos contidos no manifesto, como o que prega a "socialização dos meios de produção". Ainda assim, Amaral continuou na defesa de que o texto é histórico e, portanto, “imutável”.

Ele argumentou que o próprio Campos estaria se referindo ao seu programa de governo, ao defender a mudança. “Programas de fundação partidária são programas constitutivos que não podem viver ou sobreviver à mercê das circunstâncias, desta ou daquela eleição, ou das alterações, também circunstanciais, da pequena política”, disse Amaral.

“O que muda, e muda a cada campanha, é o programa de governo, que elaboramos a cada eleição. O manifesto-programa, da fundação, é peça histórica e, assim, imutável”, disse Roberto Amaral ao iG.

A ponderação de Amaral ocorreu após ele se reunir, na terça-feira (6), na sede do partido, com Carlos Siqueira, um dos principais participantes do núcleo da campanha de Campos. Ele ainda classificou a polêmica sobre possível retirada do trecho do estatuto que defende a “socialização dos meios de produção” como “rotunda tolice” alimentada pela imprensa.

Responsável por formatar o programa de governo de Eduardo Campos, o ex-deputado e ex-petista Maurício Rands, filiado recente do PSB, confirma que a mudança nos ideais da campanha deverá será feita. “O programa de governo vai espelhar a adaptação dos princípios do PSB às necessidade do Brasil atual. Falar em “socialização dos meios de produção” é fazer uso de uma linguagem datada de 1947. É coisa do passado”, disse Rands, que também classificou a polêmica como prejudicial à campanha.

“A constituição dos Estados Unidos é datada de 17 de setembro de 1987 e foi sendo interpretada pela Suprema Corte de acordo com as circunstâncias de cada tempo”, comparou. “Polemizar sobre mudanças no manifesto é criar um falso dilema”, argumentou.

As críticas ao manifesto socialista ganharam as redes sociais e preocuparam a campanha de Campos. A polêmica ganhou força após reportagem da Folha de S. Paulo que mostrou uma troca de mensagens do coordenador de Comunicação da pré-campanha de Campos, Alon Feuerwerker, perguntando ao próprio Campos se era possível mexer no estatuto na convenção do partido, que será realizada em junho.

No início da semana, Campos chegou a defender publicamente a mudança, mas provocou reação de Amaral e de outros socialistas.

Para a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), a defesa de qualquer mudança no estatuto só pode ocorrer com o aval do congresso do partido. “Não se muda um documento histórico de 70 anos com uma reunião qualquer. Não conversei com ninguém do partido, mas eu penso assim”, disse a deputada. “Se ele quer mudar o conteúdo do documento tem que ser por meio do congresso do partido. Fazer isso em um ano eleitoral é perda de tempo”, ponderou.

Um debate teórico sobre socialismo ou capitalismo, de acordo com Erundina, criaria uma polêmica que atrapalharia a discussão de questões estruturantes do País. “O que a gente precisa neste ano é discutir o País, o método de gestão, quebrar essa polarização entre PT e PSDB. É um ano para se discutir a desigualdade, a violência, o baixo crescimento, a cidadania que está faltando para o povo e não ficar discutindo uma tese abstrata que não faz sentido para a sociedade”, defendeu.

Entre os mais próximos a Eduardo Campos, no entanto, a disposição do pré-candidato de reformar o estatuto é necessária, no entanto, a avaliação é de que enfrentar este debate dentro do partido em um ano eleitoral significaria provocar uma situação de desunião que poderia prejudicar a campanha.

Além da “socialização dos meios de produção”, os pontos que limitam a propriedade privada, pontos centrais do manifesto socialista, são considerados ultrapassados. “O partido tem hoje cerca de um milhão de filiados e posso garantir que 90% só vieram a tomar conhecimento da questão dos meios de produção agora, depois desta polêmica”, disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).

“Se for possível mudar na convenção, acho que não teria nem disputa, se precisar fazer um congresso dentro da convenção, pode também ser feito”, ponderou o deputado, um dos mais próximos a Campos.

Também fundador do partido, o senador João Capiberibe (PSB-AP) concorda com Campos ao defender que a mudança no estatuto é necessária. “De 1947 para cá houve uma grande mudança em relação aos meios de produção, ao ponto de tornar essa expressão até inadequada nos dias de hoje. É necessário que façamos uma evolução deste conceito”, defendeu o senador.

“Acho que podemos mudar o termo socialização dos meios de produção para socialização dos recursos naturais. Quem sabe até o pessoal da Marina possa contribuir com a gente para a revisão do programa para que a gente possa perseguir como objetivo do partido garantir que todos tenham acesso à água, ao solo e à atmosfera”, sugeriu o senador.

(do iG)


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