BRASIL

Reportagem da NORDESTE mostra que Chikungunya é pior do que se pensava

No Brasil desde 2014, a Chikungunya está se espalhando cada vez mais e se mostrando uma doença muito pior do que se pensava. A Revista NORDESTE ouviu o relato de uma médica que contraiu a doença e também o Dr Carlos Brito, membro do Comitê Técnico de Arboviroses do Ministério da Saúde, que coordenou um novo protocolo de tratamento da chikungunya.

Confira a matéria a seguir;

O Vilão da vez

Aumento de casos de chikungunya acende alerta: doença causa dores que duram meses e pode causar até impacto econômico negativo

Por PEDRO CALLADO

"Começou de repente. Dormi bem e acordei com dores como se tivesse tido uma aula puxadíssima de ginástica. Mas estava só começando. As dores pioraram no decorrer do dia, na hora do almoço já estava na cama com febre muito alta. Dores indescritíveis até para me mexer na cama. E a febre é bem alta. Tentei me levantar sozinha na primeira noite e quase desmaiei. Muita falta de apetite. Foram uns três dias assim. Daí em diante, a febre foi melhorando, as dores ainda muito fortes, mas já dava pra caminhar. E muita fraqueza, que se manteve por uns 20 dias. A falta de apetite, a partir do quarto dia, virou enjoo. Não passava com nada. Isso ficou rendendo por uns 10 dias. A fase aguda é terrível”.

O relato é da médica Beatriz Pragana Dantas, uma pernambucana que reside em João Pessoa na Paraíba. A médica teve chikungunya em maio e acompanhou outras quatro pessoas picadas pelo mosquito e compartilhou com a Revista NORDESTE como tem sido a experiência e o que tem feito para aguentar as dores que insistem em retornar.

Para Beatriz a fase aguda passou depois de 15 dias, mas as dores articulares foram evoluindo e se tornaram constantes com um mês da doença. Mesmo com a melhora do quadro febril, do enjoo e das dores musculares, as dores nas articulações causam um impacto grande no seu dia a dia. “A grande limitação da doença, desde o início, é em relação aos movimentos. Até hoje é complicado virar uma maçaneta, abrir uma torneira… estou usando alicate pra abrir garrafa PET. Não espremi mais limão nem alho… tudo que envolve força fica comprometido pela dor. Não dobro mais os joelhos. E ando pisando com o maior cuidado porque qualquer desnível no chão causa dor nos pés e tornozelos…”. Na sua fase aguda, a doença ainda causa aftas na boca, inchaço, nas pernas e mãos, dores de cabeça e manchas vermelhas pelo corpo.

Com este teor altamente incapacitante, o mosquito Aedes aegypti, que foi o grande vilão de 2015, tem tudo para repetir o feito ao longo de 2016. Enquanto no ano passado a Zika e as suas consequências, em particular a microcefalia, geraram comoção e alerta de epidemia em todo o país, desta vez a chikungunya pode causar grande impacto, inclusive econômico, atingindo a força de trabalho.

O vírus circula no Brasil desde 2014. De lá para cá a doença se alastrou, principalmente no Nordeste do país. Especialistas explicam que as dores e outros problemas mais sérios – como inflamação crônica nas juntas, problemas de visão e até mesmo meningoencefalite, uma espécie de meningite – causados pela chikungunya, podem persistir por até três anos e se tornarem crônicos.

Em entrevista à Revista NORDESTE, o Dr. Carlos Brito, que é pós-graduado pela Fiocruz, membro do Comitê Técnico de Arboviroses do Ministério da Saúde que combate a dengue, zika e chikungunya, confirmou que há equívocos na forma de tratar a doença atualmente. Brito explicou que o Governo irá emitir um novo protocolo de combate à doença. “O novo protocolo foi elaborado por especialistas em dor, reumatologista, infectologista, clínico. Eu coordenei a elaboração. Estamos só aguardando a liberação oficial”, conta.

O novo protocolo irá trazer orientações para a abordagem adequada, mas, além disso, também haverá instruções do que não deve ser feito. Segundo Brito, já foram notificadas algumas mortes causadas, possivelmente, por um erro na prescrição de remédios. “Além do protocolo ter a proposta de orientar os profissionais médicos a prescreverem os medicamentos nas diferentes fases, desde a fase aguda, orienta também o que não fazer. Muitos pacientes que tem dores articulares, tem recebido prescrição de anti-inflamatórios que são contra indicados na fase aguda, isso pode levar a complicações, com algum tipo de coagulação e lesão renal”, explicou.

A fase aguda são os 13 ou 14 primeiros dias, depois a doença entra na fase subaguda, que varia entre 10 dias e até 3 meses ou mais, ainda com dores articulares. Por fim, existe a fase crônica da doença, quando ela se torna incurável e evolui para uma artrite crônica. “Metade dos que passam pela fase aguda, podem continuar com dores articulares. A ideia é orientar o que deve ser feito no tratamento também na fase subaguda e na crônica”, explica.

SINTOMAS

Os principais sintomas são febre alta de início rápido, dores intensas nas articulações dos pés e mãos, além de dedos, tornozelos e pulsos. Pode ocorrer ainda dor de cabeça, dores nos músculos e manchas vermelhas na pele. Não é possível ter chikungunya mais de uma vez. Depois de infectada, a pessoa fica imune pelo resto da vida. Os sintomas iniciam entre dois e doze dias após a picada do mosquito. O mosquito adquire o vírus CHIKV ao picar uma pessoa infectada, durante o período em que o vírus está presente no organismo infectado. Cerca de 30% dos casos não apresentam sintomas.

TRATAMENTO

Até o momento não há um tratamento específico para a chikungunya. As medicações indicadas são para apenas aliviar os sintomas.

FASE AGUDA
• PARACETAMOL ou DIPIRONA para combater dores e febre
• Antiinflamatórios e Aspirinas não devem ser utilizados
nesta fase.
• É recomendado COMPRESSA FRIA onde há dor, HIDRATAÇÃO regular com ingestão de pelo menos dois litros de água por dia e é fundamental muito REPOUSO, para evitar evoluções.

FASE SUBAGUDA E CRÔNICA
• DIPIRONA pode ser mantido para dores
• AINE via oral pode ser utilizado por pacientes com mais dores, mas atenção! para as muitas contraindicações deste medicamento. Consulte um médico
• Retornar gradativamente a realizar ATIVIDADES FÍSICAS.
• O suco de INHAME CARÁ (o menor e peludo) batido com frutas é um bom suporte para o tratamento. 
• Pílulas de Sucupira com Magnésio ajudam a aliaviar as dores e o inchaço 

Chikungunya será pior que a Zika

Com a alta capacidade da chikungunya de se alastrar em uma cidade, o impacto causado pela doença vai além da saúde dos cidadãos. O doutor Carlos Brito ressalta que o vírus pode atingir até 40% da população de uma cidade de uma só vez. “Considerando que a fase aguda dura até duas semanas, imagine só milhares de pessoas tirando licença médica ao mesmo tempo. Levando em conta que a doença se espalha em núcleos, podendo atingir diversos membros de uma família ou no ambiente de trabalho, muitas empresas podem sofrer impactos econômicos por ficarem desfalcadas no período”, avalia.

”Na minha percepção, hoje, a doença tem uma gravidade por vários aspectos: uma, porque a Chikungunya, assim como as outras arboviroses (doenças causadas por insetos), elas vão atingir o país como um todo, então isso é inevitável; a gente deve ter nos próximos anos, outros estados sendo acometidos, como foi aqui no Nordeste inicialmente”, avisa.


Brito afirma que desde a entrada da chikungunya no Brasil a estimativa é de 2 milhões e duzentos mil casos da doença. Os números são altos porque o Aedes já circulava no país e muitas vezes a doença é confundida com a dengue. “Para se ter uma ideia, numa cidade como Recife, que tem 1,6 milhões de habitantes, uma faixa de ataque para 30% da população, a gente pode ter 400 mil pessoas doentes. Em uma capital como Recife! Imagine você em uma cidade como São Paulo, de proporções muito maiores, pode chegar a milhões de casos”.

Ao comparar a doença com a dengue e a zika, Brito destaca de que forma a Chikungunya pode ter um impacto muito maior. “Ela impressiona por conta do número de pessoas, imaginando que 50% dos que adoecem chegam a fase crônica, então em Recife, se tivesse 400 mil doentes, depois teria 200 mil procurando os ambulatórios com dores articulares. É uma doença com caráter incapacitante, sem conseguir trabalhar, sem conseguir realizar suas atividades habituais. Alguns pontos de alteração de humor, como depressão, distúrbio do sono. Então dá para ver que é uma doença com um impacto socioeconômico extremo. E ela perdura por meses ou anos em uma parcela significativa”.

O médico alerta que os governos não podem esperar novas surpresas, é preciso se preparar. “Tem que ter uma estrutura de especialização de serviços para atender essa demanda, não só na fase aguda, mas também no atendimento ambulatorial. Não vai ter especialista, reumatologista, para atender essa demanda. Então tem que capacitar clínicos, pediatras, outras especialidades para lidar com esses pacientes. A gente tem que se preparar para não ser pego de surpresa”.

Distribuição da doença

Segundo o último boletim divulgado pelo Ministério da Saúde (11 de junho), já foram registrados 137.808 possíveis casos de chikungunya em todo o país. Só no Nordeste são mais de 120 mil. Em 2015, no mesmo período, foram 14.277 casos suspeitos no Brasil, sendo 13.156 no Nordeste.

Alagoas 5.930
Bahia 38.991
Ceará 12.573
Maranhão 6.815
Paraíba 9.309
Pernambuco 25.990
Piauí 1.201
Rio Grande do Norte 15.278
Sergipe 4.493

Dois vírus

A informação de que existem duas variações da chikungunya circulando pelo país é verdadeira. Mas isso não é motivo para se alarmar. De acordo com o doutor Carlos Brito, uma doença acaba anulando a outra. “Existe uma linhagem asiática e uma africana, mas não tem muita diferença na manifestação clínica das duas. Aqui no Brasil já entraram as duas, a africana por Feira de Santana, na Bahia, e a asiática pelo Oiapoque, no Amapá. É possível que os dois estejam circulando, mas entrando em contato com apenas um deles, a pessoa já fica imunizada de forma cruzada. Ou seja, protegida contra os dois. Se for picado pela outra linhagem, o seu organismo já terá anticorpos para te proteger”. 

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