BRASIL

Usuários vivem batalha judicial por remédio que promete curar câncer

Por Luan Matias

Nos últimos meses a área da saúde esteve em evidência no Brasil. Foram discussões em diversos níveis, desde problemas com grandes operadoras de saúde suplementar, passando pela liberação do canabidiol para uso medicinal, até o alto número de casos de microcefalia, especialmente no Nordeste. Mas certamente a pauta mais envolvida em polêmicas e controvérsias é a possível cura do câncer, que teria sido desenvolvida pelo professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), Gilberto Chierice.


A substância responsável pela evolução do tratamento do câncer é a fosfoetanolamina sintética, que por muito tempo foi estudada de forma independente pela equipe do professor Chierice. Embora centenas de pacientes relatem histórias de evolução em seus quadros ao passarem a utilizar a droga, ainda não há comprovações científicas da eficácia do tratamento. Funcionários do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP distribuíam a fosfoenolamina para pacientes com câncer, mas a prática foi suspensa. Os estudos começaram ainda na década de 1990 e até 2014 eram doadas cápsulas, mas uma portaria mudou o sistema e impossibilitou essa distribuição. Apesar disso, algum tempo depois pacientes de todo o país voltaram a receber a substância através de liminares judiciais.


A eficácia da fosfoetanolamina sintética, que ainda não possui registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), tem gerado muitas controvérsias no meio médico. Em outubro a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica divulgou uma nota se posicionando sobre a substância, mostrando-se a favor de pesquisas mais detalhadas sobre a situação. “O estudo determina os efeitos colaterais, a melhor administração e as indicações de medicação. Isso vale para um antibiótico e para um remédio contra o câncer. É o que dá noção de eficácia e segurança para ser usado”, disse Evanius Wiermann, presidente da instituição.


O Instituto de Química de São Carlos afirmou não ter capacidade para produzir a droga em grande escala, reforçando a necessidade da regulamentação. A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica diz que apenas estudos amplos podem comprovar os benefícios e eficácia do tratamento, que já foi tema de audiências públicas no Senado e na Câmara. O Ministério da Saúde anunciou a criação de um grupo para estudar especificamente a substância e avaliar os seus efeitos contra o câncer. A intenção é investir R$ 10 milhões nas pesquisas.


Segundo os resultados obtidos pelas análises lideradas pelo professor Chierice, a fosfoetanolamina sintética tem comprovadamente função antitumoral, sendo um substrato formador de estruturas das membranas celulares. De acordo com familiares e usuários de todo o Brasil, a substância experimental tem mostrado resultados positivos no combate à doença, existindo até relatos de cura.


Em meio a polêmica discussão, a reitoria da USP divulgou uma nota afastando-se institucionalmente da produção e distribuição da substância, que embora esteja sendo feita em respeito às liminares judiciais, já tenta ser revertida pelo setor jurídico da universidade. “Essa substância não é remédio. Ela foi estudada na USP como um produto químico e não existe demonstração cabal de que tenha ação efetiva contra a doença: a USP não desenvolveu estudos sobre a ação do produto nos seres vivos, muito menos estudos clínicos controlados em humanos”, diz a nota. Há um claro conflito entre a administração da universidade e o grupo de funcionários do Instituto de Química de São Carlos.

Primeiro caso na Paraíba

No Nordeste vários pacientes já conseguiram liminares para iniciarem tratamento com a fosfoetanolamina sintética. Na Paraíba, o primeiro caso aconteceu em Santa Luzia, cidade localizada a 270 km da capital João Pessoa. “A família já vinha estudando a substância e assistindo notícias. Por ter pessoas da área da saúde entre os parentes, estavam bem entendidos sobre o tema. Eles procuraram o poder judiciário e já vieram com muitas informações”, disse Juliana Nóbrega, advogada do caso que preferiu manter o nome do paciente em sigilo. “Utilizamos argumentos contidos na Constituição Federal em relação ao direito à vida. O juiz acatou em 24 horas e deu o prazo de 20 dias para a USP conceder a medicação. Nenhuma outra medida contrária foi tomada”, complementou Nóbrega.


O paciente, já idoso, foi diagnosticado com a doença há cerca de três meses, embora tenha se constatado que a doença já existia há provavelmente uma década. “Os sintomas apareceram há um ano, mas, ele não relatava. Tinha sangramento ao defecar todos os dias, tinha vergonha de dizer e achava que era apenas hemorróidas”, contou a filha, Cláudia Gonçalves.

Cláudia é enfermeira e conhece quão castigante é a terapia convencional para o câncer, sobretudo em um idoso. Ela relatou que encontrou na substância uma esperança para a cura do seu pai. No início de dezembro, a família recebeu as primeiras cápsulas para o início do tratamento “Tudo vale a pena. Quando se recebe diagnóstico de neoplasia, a gente se agarra a qualquer esperança. Eu acredito, se existe a pesquisa, existe o relato, a gente não perde nada tentando. Quando soube pela mídia da possibilidade, decidi lutar”, concluiu.  


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