NORDESTE

Coordenador do Consórcio Nordeste explica como a articulação de governadores fez a diferença durante a pandemia no Brasil

A nova edição da Revista NORDESTE traz a publicação de entrevista com o coordenador do Comitê científico do Consórcio Nordeste, Sérgio Rezende, que explica como a articulação realizada pelos governadores nordestinos, durante a pandemia da Covid-19, fez a diferença do Nordeste em relação às demais regiões do Brasil.

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Leia a entrevista, na íntegra:

O SALDO CRÍTICO POSITIVO DO CONSÓRCIO NORDESTE AGUARDANDO ELEIÇÃO DE LÍDERES COM AVANÇOS

Coordenador do Comitê Científico explica como articulação de governadores na pandemia fez a diferença do Nordeste na relação com o Brasil

Por Walter Santos

Entre todos os cenários públicos existentes nos últimos anos nenhum tomou a dimensão como o Consórcio Nordeste, Fórum produzido pelos governadores dos 9 estados em contraponto a encolhimento da Sudene, gerando inúmeros programas de reforço às políticas estaduais apresentando resultados. Um deles é o saldo do Consórcio Nordeste produzindo forte  redução de óbitos pelo papel do Comitê Científico. É o que diz em entrevista EXCLUSIVA, o coordenador e professor doutor Sérgio Rezende.

Revista NORDESTE – O Sr.  se mantém como coordenador científico do Consórcio Nordeste. Na sua leitura com base nas muitas informações existentes em diversas áreas, como será o futuro do Consórcio depois das eleições?

SÉRGIO REZENDE – Eu sou coordenador do Comitê Científico de combate ao Coronavírus, apenas especificamente dessa área, eu continuo como coordenador. É lógico que o Comitê Científico tem feito muito pouco nos últimos meses, temos tido uma reunião a cada um mês, um mês e meio, porque a pandemia está em um ritmo lento, ela não acabou, e pelo fato dela não ter terminado, nós ainda não nos extinguimos. Há dois meses nós estávamos no começo da quarta onda, mas parecia que ela seria menor e que como nós já estávamos cansados desse processo. Nós propusemos ao presidente do consórcio Nordeste, o governador Paulo Câmara, fazer uma reunião de encerramento, encerrar as atividades, ele então disse que isso não seria um bom sinal, porque nós estávamos na quarta onda e poderia dar impressão para população que  a pandemia acabou a pandemia. Não acabou, então nós continuamos como eu falei, com pouca atividade, nosso último boletim foi emitido há cerca de um mês e meio e nessas condições eu continuo como coordenador.

NORDESTE – Qual o futuro desse processo?

SÉRGIO REZENDE – Sobre como será o futuro do Consórcio depois das eleições, é muito difícil afirmar, mas eu espero que os governadores atuais tenham feito um trabalho que seja bem visto pelos futuros governadores. Em vários Estados esperamos que os futuros governadores sejam do mesmo partido, da mesma linha de governadores atuais e outros não serão certamente, mas eu espero que independente da cor política, percebam que a reunião dos nove estados do Nordeste em um Consórcio foi muito benéfica para todos os Estados de formas diferentes e que o consórcio Nordeste seja mantido depois das eleições.

Foto: Revista Nordeste / Reprodução

NORDESTE – De forma objetiva e transparente, qual foi o papel na prática do Comitê Científico para reduzir a prospecção de mortes de nordestinos na Pandemia?

SÉRGIO REZENDE – Na minha opinião, o papel do Comitê científico foi muito importante porque o Brasil tem hoje mais de 680 mil mortes pela Covid em quase dois anos e meio de pandemia. Esse número de mortes corresponde a aproximadamente 12% do número de mortes em todo mundo. Agora, a população do Brasil em relação à população do mundo é de pouco mais de 2%, portanto, o Brasil teve em relação ao mundo seis vezes mais mortes relativamente. Isso eu não tenho dúvida de que é resultado do fato de não ter havido uma coordenação nacional de combate ao coronavirus, pelo contrário, o presidente da República desde o início da pandemia foi contra as medidas que deveriam ter sido tomadas, e que indicadas pela ciência, como por exemplo o isolamento social, o lockdown em caso mais rígido, uso de máscaras. Ele recomendou o uso de medicamentos que não tem eficácia comprovada e depois ele foi contra vacinas, ele é contra vacina até hoje, é um absurdo total.

NORDESTE – Qual o papel real dos governadores?

SÉRGIO REZENDE – Então, o que aconteceu é que os governadores do Nordeste, percebendo esse desatino no Governo Federal, resolveram criar este comitê científico, isso foi feito no final de março de 2020 quando a pandemia estava começando a acelerar entre nós, e o nosso papel foi reunir especialistas, formamos 9 subcomitês, cada um voltado para um tema da pandemia como por exemplo a virologia, a questão de medicamentos hospitalares, a epidemiologia, muito importante, que é o que nós temos nessa pandemia, estudos da epidemiologia, e assim por diante.

NORDESTE – Como tudo se deu?

SÉRGIO REZENDE – A partir dos estudos, das conclusões dos especialistas em vários comitês, nós emitimos boletim de recomendações para governadores, prefeitos, e para a sociedade em geral. Passaram dois anos e meio, nós temos a situação trágica no Brasil, mas o resultado objetivo e transparente é que todos os estados do Nordeste têm menos morte da Covid em relação à população do que a média nacional.

NORDESTE – Qual o saldo real dessas instruções?

SÉRGIO REZENDE – Todos os estados nordestinos  têm menos mortes que a média nacional e os estados que têm menos mortes em relação à população do Nordeste, o estado com menos morte em relação à população, ou seja, por habitante, é o Maranhão. O segundo é Alagoas, o terceiro é a Bahia e assim por diante. De todos os estados, têm menos mortes por habitante do que do que a média nacional e portanto o Nordeste é objetivamente a região do país com menor mortes por habitantes.

Foto: Revista Nordeste / ReproduçãoNORDESTE – Estamos numa fase de entressafra onde as eleições geram cenários desconhecidos. Como o saldo dos governos nos últimos 4 anos devem repercutir eleitoralmente em 2022?

SÉRGIO REZENDE – O que nós tivemos no país nesses últimos 4 anos foi, na minha opinião pessoal, um cenário de desgoverno federal. Eu já  falei sobre o resultado desse desgoverno, o que aconteceu na saúde das pessoas, mas não foi só com a saúde, foi com a educação e com a ciência e tecnologia, todas colocadas em baixíssima prioridade pelo governo, foi na economia, o desemprego aumentou muito nesses anos, nós tivemos uma inflação muito grande e nós estamos entrando numa situação muito difícil em que o número de pessoas em situação de fome no Brasil tem o número altíssimo, 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil e o Brasil voltou ao mapa da fome, como nós sabemos. O que aconteceu é que os governos do Nordeste todos eles tiveram uma contraposição do Governo Federal em todos esses aspectos, então em vários estados houve um avanço relativo a outros estados. Dois exemplos: um exemplo na minha área de trabalho que a ciência e tecnologia por todos os 9 estados do Nordeste hoje tem uma Fundação de Apoio à Ciência que  vários não tinham isso a 5/6 anos e os governos foram criando essas fundações exatamente porque o governo federal foi cortando a  as verbas da ciência, do CNPQ, da Capes,  assim por diante. Então os governos  criaram reativaram sua Fundação de Apoio à Ciência e na comunidade científica há reconhecimento desse fato na área da Educação alguns estados fizeram progresso muito grande, apesar da dificuldade, é o caso do Ceará, da Paraíba, de Pernambuco, eu conheço melhor, que gradualmente foram criadas escolas em tempo integral, foram feitos programas para incentivar os alunos, ampliando a merenda escolar e assim por diante. Houve um avanço dos governos estaduais, então eu acho que o que vai acontecer nessas eleições, posso estar enganado, é que nós vamos ter em quase todos, na maioria dos estados do Nordeste, a eleição de governadores que representam de alguma forma uma continuidade dos governos atuais, em alguns não será exatamente do mesmo partido porque tem divisões naturalmente, mas os governadores estarão em linha de semelhança dos governos atuais. Então eu acho que em vista do cenário nacional, o saldo dos governos estaduais é relativamente positivo e nós vamos ver isso repercutindo, eu espero, imagino, nas eleições de 2 de outubro próximo.

NORDESTE – A sua inserção começa na ciência e tecnologia.  Qual o resumo do que significa o Consórcio na estruturação de uma base regional consistente?

Foto: Revista Nordeste / Reprodução

SÉRGIO REZENDE – Essa experiência do consórcio Nordeste de criar um comitê científico para questão específica da Covid acabou levando os governadores a entender que eles precisavam melhorar a articulação entre os estados, ou seja, promover a articulação dos estados em várias áreas importantes, e então o que que foi feito no último ano nos últimos 12 meses, o consórcio criou o que chamam câmaras temáticas. As câmaras temáticas são compostas principalmente, majoritariamente, por secretários e secretárias de estado que atuam na área da câmara e também tem um comitê deles, um comitê científico de assessoramento, então o Consórcio Nordeste já tem hoje uma câmara temática de saúde que foi a continuação natural da articulação na saúdem mas tem uma câmara temática do meio ambiente. Cada câmara é coordenada por um governador e tem um comitê. Então temos uma câmara setorial de saúde, uma câmara setorial de Meio Ambiente, uma câmara setorial de educação, uma câmara setorial de ciência e tecnologia, que na verdade levou muitas pessoas do nosso subcomitê de fomento à ciência, que estão lá agora nessa câmaras temáticas, que fazem um articulação das gestões estaduais em cada área importante, também tem de segurança,  assistência à população e assim por diante.

NORDESTE – Enfim  como tipificar a conjuntura?

SÉRGIO REZENDE – Eu acho que essa experiência do consórcio ela está sendo muito exitosa, já tem resultado em algumas áreas e eu acho que isso vai ser um estímulo muito grande para os novos governadores, alguns até serão reeleitos, eu imagino, e isso vai então, de certa maneira, consolidar o consórcio e quero dizer mais: se o presidente Lula for eleito com o que eu estou contando de forma otimista, e se consórcio vai ter um apoio do governo federal porque a lei que possibilitou a criação do consórcio, que é uma entidade com base jurídica, foi uma lei aprovada no governo do presidente Lula, então o presidente Lula valoriza esse intercâmbio, essa troca de experiência, de trabalho coletivo entre Estados, ele não será um presidente centralizador no governo federal, eu acho que ele vai estimular isso.

NORDESTE – Como o Sr. tem encarado continuadas decisões do governo federal de retrair apoios e recursos para o segmento e qual a fórmula para impedir a fuga de nossos gênios para o exterior?

SÉRGIO REZENDE – Infelizmente, nós estamos perdendo pessoas que tiveram uma formação muito longa promovida no Brasil, muitos, toda educação foi feita pelas escolas e pelas universidades públicas, pessoas que foram da creche, do Ensino Fundamental ao doutorado e ao pós-doutorado e que foram para o exterior. Eu conheço vários estudantes que estão no exterior, alguns gostariam de voltar, outros já acham que não vai ter condições de fazer isso, isso é resultado do fato deste desgoverno, eu não consigo tratar do Governo Federal, eu trato como desgoverno, na forma com que o desgoverno tratou a ciência, educação, cortando recursos, já falei no corte de recursos do CNPQ, da Finep, da Capes, e precisa acrescentar no corte de recursos das Universidades e das escolas técnicas, dos Institutos Federais. A Universidade Federal de Pernambuco, que dia 11 de Agosto, completou 76 anos, o reitor da Universidade Federal de Pernambuco disse que não tem recursos para pagar despesas de água, luz, e de limpeza, que é feita a terceirizadamente, a partir de outubro, novembro deste ano. Então, esse corte de recursos, ele desestimula os jovens a fazer carreira científica e faz esse essa essa situação trágica de ter pessoas indo para o exterior e que vão deixar de contribuir para o Brasil.

NORDESTE – E como resolver?

SÉRGIO REZENDE – A fórmula para resolver isso é ampliar os recursos e ampliar os recursos não é difícil, depende de decisão do governo federal, do presidente da República. A dívida pública do Brasil consome hoje aproximadamente 5 bilhões de reais por dia, o orçamento do Ministério da ciência e tecnologia para o ano todo é inferior a 10 bilhões de reais. O FNDCT, que foi cortado pelo governo, foi cortado em 5 bilhões de reais, 5 bilhões de reais é um dia de pagamento de juros, então nós precisamos é ter um governo que valorize a ciência, educação, e caso Lula ser eleito eu estou contando com isso, vai ser revertido, como ele já tem declarado.

NORDESTE – E quem incorpora melhor a construção de saídas para o Brasil entre os candidatos a presidente?

SÉRGIO REZENDE – O candidato Lula, ex-presidente Lula, recentemente foi à reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em Brasília, e participou de um evento no auditório lotado com mais de 600 pessoas onde ele reafirmou as propostas dele para Ciência e Tecnologia.

NORDESTE – acompanhando os vários estados, qual sua opinião sobre o nível da Tecnologia da Informação, da inovação nas várias capitais? Estamos em que estágio?

SÉRGIO REZENDE – Eu tenho dito que a ciência brasileira é muito nova, os pesquisadores em qualquer país, no Brasil também, são formados nos cursos de pós-graduação e os cursos no Brasil só foram institucionalizados em 1968. É um tempo relativamente curto na história de um país e por isso a ciência ainda não deu no Brasil resultados que ela tem dado em outros países pelo curto tempo de existência e também pela dificuldade que eu mencionei, de nós temos governos que cortam o apoio à ciência, então nós não temos uma política de estado, vem um governo, apoia, cria programas, vem outro desgoverno e tira o apoio, e assim por diante.

Foto: Revista Nordeste / Reprodução

NORDESTE – E os 9 estados?

SÉRGIO REZENDE – O Nordeste progrediu muito nas suas universidades e portanto no ambiente em torno dela, e não é só nas capitais, o governo do presidente Lula fez um grande esforço para interiorizar as universidades federais e esse esforço tá dando resultados que são visíveis em todos nove estados. O Estado da Paraíba tem uma situação privilegiada, por que já tinha antes uma universidade na capital, um campus da universidade em Campina Grande, de alto nível, em tecnologia da informação, e inovação, assim por diante, esse campus tornou-se uma universidade. A Universidade Federal de Campina Grande, mas atualmente a Paraíba tem Campi das duas Universidades em vários outros municípios como em Bananeiras, Areia, Patos, e assim por diante. Então, essa interiorização da educação pública de qualidade, ela está transformando o cenário do Nordeste, principalmente, que era desprovido disso, alguns estados do sudeste, como Minas Gerais, já tinham universidades no interior, mas no Nordeste isso praticamente não havia, então a evolução é muito grande, nós temos um número crescente de empresas de tecnologia avançada e em todos os estados do Nordeste. Um exemplo muito concreto, específico, algumas semanas o nosso grupo de pesquisa precisou comprar uma placa de interface para computador, chamada uma placa GPIB, e aí meu estudante de doutorado entrou na internet para ver se ele podia comprar no Brasil, e para minha grande alegria existe uma empresa em Campina Grande que vende a placa de nível Internacional.

NORDESTE – olhando para o futuro próximo, que desafios maiores os 9 estados devem enfrentar estrategicamente na direção do desenvolvimento?

SÉRGIO REZENDE – Sou de opinião que os estados têm que priorizar a educação em todos os níveis,  principalmente no nível médio e no nível técnico, que é a responsabilidade dos Estados, agora o resultado desse trabalho não vai aparecer no futuro próximo, ele vai aparecer no futuro mais longínquo, mas ele é absolutamente essencial, é muito importante que os estados, os novos governos, tenham a educação como uma das suas prioridades, melhoria do sentido de criar escolas de tempo integral, melhorar a formação de seus professores, melhorar o ambiente dos estudantes oferecendo merenda escolar, alimentação, e assim por diante, e também trabalhando para virar escolas estaduais para ensino técnico, precisamos da nossa juventude também no ensino técnico. O segundo desafio importante é exatamente criar programas que diminuam o sofrimento da população, principalmente em relação à questão de condições mínimas de alimentação.

NORDESTE – Mas as mazelas ampliaram…

SÉRGIO REZENDE – Com a eleição do presidente Lula, nós voltaremos a ter programas federais importantes, com recursos, e não programas eleitoreiros como esse que foi criado recentemente, uma melhoria do Auxílio Brasil, uma lei que tem validade até o último dia desse ano, como se as pessoas fossem matar a fome só até o final do ano. Esses programas terão recursos do governo federal, mas eles têm que ser conduzidos por quem está na ponta, e quem tá na ponta é o governo estadual, governo municipal, que têm um papel muito importante na articulação de municípios, na articulação para mostrar o que é feito nos estados, que têm melhores programas e assim por diante. Combater a fome deve ser uma prioridade imediata para o futuro próximo. Outro desafio importante é exatamente o de criar empregos, porque o desemprego no Brasil está num nível muito alto e no Nordeste ele é muito grave. Para isso, os estados devem novamente participar com os programas que serão criados no Governo Federal para promover o desenvolvimento econômico, é a promoção do desenvolvimento econômico que estimula a criação de empregos.


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